Folha de S. Paulo


Candidatos partem para o ataque no último debate antes do segundo turno

Os dois candidatos à Presidência argentina saíram ao ataque no último duelo antes do segundo turno, no próximo domingo (22).

Em debate ágil e com indagações diretas –não houve perguntas de jornalistas–, o governista Daniel Scioli (FPV) e o oposicionista Mauricio Macri (Mudemos) tentaram expor as debilidades e as contradições um do outro.

Scioli insistiu na ideia de associar a "mudança" anunciada pela campanha de Macri com um ajuste econômico que significaria perda de direitos dos trabalhadores e de benefícios sociais, identificando o rival com as políticas neoliberais dos anos 90 que resultaram na crise de 2001. "Não vamos voltar a nos ajoelhar diante do FMI", afirmou.

Já Macri atacou Scioli devido aos aspectos negativos da herança kirchnerista –como o aumento da pobreza e a estagnação da economia. Afirmou, ainda, que, se eleito, acionaria a cláusula democrática com relação à participação da Venezuela no Mercosul.

"É uma questão importante para a América Latina, temos de optar por estar ao lado dos países que defendem a democracia", disse.

Martín Zabala/Xinhua
Daniel Scioli (esq.) e Mauricio Macri durante o debate presidencial deste domingo
Daniel Scioli (esq.) e Mauricio Macri durante o debate presidencial deste domingo

ATAQUES AO KIRCHNERISMO

"Você precisa dialogar comigo, e não com um governo que está saindo", disse Scioli mais de uma vez para tentar conter os ataques de Macri ao atual governo de Cristina Kirchner.

Já o candidato do Mudemos debochou do governista quando este defendia a presidente. "Você está parecendo um debatedor do '6,7,8'" –programa da TV pública criado pelo kirchnerismo e que se destina a atacar os meios de comunicação independentes.

Em geral, Macri se mostrou mais descontraído, ironizando quando o oponente estourava o tempo destinado às respostas. "Você precisa respeitar as regras, Daniel."

Já Scioli reagiu com vigor e teve bons momentos ao devolver provocações de Macri, como no momento em que este apresentou sua proposta para combater o narcotráfico.

"É sério que você quer que as pessoas acreditem que vai combater o narcotráfico se não consegue coibir a ação dos flanelinhas?", disse o governista, referindo-se à gestão de Macri na Prefeitura de Buenos Aires.

Scioli também fez com que Macri gaguejasse ao tentar responder por que havia sido contra a criação de um escritório contra escravidão humana.

Com relação ao narcotráfico, ambos apresentaram propostas duras de combate por meio de políticas de tolerância zero.

Sobre direitos humanos, Scioli sugeriu que Macri não daria continuidade ao movimento de esclarecer os crimes ocorridos durante a ditadura (1976-83). Já Macri respondeu dizendo que achava "importante esclarecer o que ocorreu, mas também cuidar dos direitos humanos nos dias de hoje".

Em suas considerações finais, o oposicionista lembrou sua gestão de sucesso como presidente do clube de futebol Boca Juniors e convocou os argentinos a votarem "com alegria".

Já Scioli voltou a afirmar que a proposta de "mudança" de Macri significaria um ajuste de alto custo para o trabalhador. E ironizou o opositor, que tenciona encerrar sua campanha na província de Jujuy, reduto peronista. "Agora, Macri descobriu que o norte do país existe."

CLIMA

Do lado de fora do auditório da Faculdade de Direito, em Buenos Aires, apoiadores dos candidatos se concentravam desde cedo.

Agrupações kirchneristas e veteranos da Guerra das Malvinas compareceram para apoiar Scioli. "É a continuação do projeto de Néstor e Cristina, que gerou inclusão social. Por isso votarei nele", disse o comerciante Leonardo Perez, 43.

Já o produtor agrícola Francisco Raul Lemme, 57, eleitor de Macri, afirmou: "O Brasil se tornou um grande produtor de carne e a Argentina caiu, a pobreza aumentou, o Mercosul sofreu um duro golpe. Torço para que ganhe Macri, para mudar tudo isso", disse.

A uma semana da eleição, pesquisa e intenção de voto do instituto Management & Fit mostrava Mauricio Macri com 8,3 pontos à frente de Scioli. Segundo a sondagem, Macri tem 52%, e Scioli, 43,7%.

No primeiro turno, Scioli ganhou com diferença apertada (37% a 34%). As equipes de estratégia de ambos os candidatos miravam, neste debate, conquistar o voto dos indecisos, estimado em 11%, e o dos que ainda admitem poder mudar de voto, em torno de 16%.

Durante o fim de semana, peronistas convocaram manifestações de apoio a Scioli em praças do país e, na capital, uma multidão se reuniu no Obelisco. No domingo, Cristina Kirchner postou fotos das manifestações em apoio a Scioli nas redes sociais com o título "Em defesa do futuro".

Diferentemente do Brasil, o debate argentino foi organizado por uma ONG, a Argentina Debate, e ocorreu em um "território neutro": a Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires. Cinco canais de TV aberta e cinco de TV a cabo exibiram simultaneamente o programa, que foi ao ar às 21h da Argentina (22h na hora de Brasília).

No Brasil, o canal de TV Band News também transmitiu o confronto. O jornalista Ricardo Boechat foi um dos conselheiros convidados pela ONG Argentina Debate para preparar o evento no país vizinho.


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