Folha de S. Paulo


OPINIÃO

Brasil precisa decidir se quer ser potência ou nação 'café com leite'

O Brasil quer ser potência global quando interessa e nação "café com leite" quando convém.

O país reivindica uma reforma no Conselho de Segurança da ONU, que hoje tem apenas cinco membros permanentes com poder de veto –China, Reino Unido, França, Rússia e EUA.

O governo brasileiro acha que o mundo mudou e que é preciso que emergentes como o Brasil tenham um lugar à mesa.

Tudo muito justo.

No entanto, com novos direitos, vêm novas responsabilidades.

O Brasil quer mais poder na ONU? Vai ter que fazer uma contribuição de gente grande, para começar, e deixar de dar calote nos pagamentos.

Embora, há que se dizer, os Estados Unidos são os maiores doadores de recursos para a ONU, mas também os maiores devedores.

.

Em vários outros foros, o governo brasileiro tem dois pesos e duas medidas.

O Sistema Geral de Preferências dos Estados Unidos concede redução nas tarifas de importação para produtos de países em desenvolvimento.

Vira e mexe, algum senador americano quer excluir o Brasil da lista de beneficiários do SGP, porque o país está classificado como sendo "de renda média alta" pelo Banco Mundial.

Mas o governo brasileiro esperneia e, pressionado pela indústria, insiste em ser mantido no sistema de preferências tarifárias para países pobres, embora seja integrante do G20, que reúne as grandes economias mundiais.

Nas negociações sobre mudança climática é a mesma coisa.

Em entrevista à Folha, Todd Stern, principal negociador dos EUA para a conferência do clima em Paris, afirmou que países emergentes como China e Brasil deveriam contribuir para o fundo de US$ 100 bilhões anuais destinado a ajudar países em desenvolvimento a se adaptar ao aquecimento global e amenizar seus efeitos.

"Não achamos que seja justa a forma de diferenciação de 1992, que só prevê duas categorias originais e nunca avança, apesar de todas as enormes mudanças no mundo [pelo Protocolo de Kyoto, é obrigação dos países desenvolvidos reduzir as emissões por causa de sua responsabilidade histórica pelo atual nível e estão isentas nações em desenvolvimento, inclusive grandes poluidoras hoje, como a China.]".

Em entrevista ao jornal "Valor Econômico", a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, sinalizou que a diferenciação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento será um grande nó na negociação de Paris.

Segundo ela, os recursos para clima devem vir dos países desenvolvidos.

Como dizem os americanos, "you can't have your cake and eat it too" –o que significa, grosso modo, não dá para ter o melhor dos dois mundos.


Endereço da página:

Links no texto: