Folha de S. Paulo


Terceiro colocado, Sergio Massa torna eleição na Argentina imprevisível

Sergio Massa subverteu uma lógica das campanhas políticas eleitorais: a de que o terceiro colocado desaparece nos debates, concentrados nos dois favoritos.

Fez isso nesta eleição presidencial argentina se vendendo como alternativa peronista –a maior corrente política argentina– de oposição ao kirchnerismo, ala radical do peronismo alinhada à atual presidente.

Assim, o mais jovem dos principais candidatos na Argentina (43 anos) angariou 21% das intenções de voto.

Está atrás do governista Daniel Scioli (38%) e do opositor Mauricio Macri (29%).

A sua força inesperada alçou o resultado da eleição argentina ao imponderável. A dois dias da votação, no próximo domingo (25), analistas não arriscam opinar se haverá ou não um segundo turno, algo que seria inédito no país.

Massa tira votos peronistas que iriam para Scioli e o levariam a uma vitória fácil na primeira votação. Também enfraquece Macri, já que se vende como opção para os que querem mudança na política argentina.

"Eu sou a única opção para que se termine com o kirchnerismo na Argentina, sou o único que pode ganhar deles em um segundo turno", propagandeou Massa em encontro recente com a imprensa estrangeira.

Nas semanas pré-eleitorais, ele passou a exibir o apoio de dois veteranos em sua campanha: o ex-ministro da Economia Roberto Lavagna, tido como responsável por tirar a Argentina do atoleiro pós-colapso de 2001, e o governador José Manuel de La Sota, um dos principais líderes do peronismo no interior argentino.

Ex-prefeito da cidade metropolitana de Tigre, a cerca de uma hora da capital Buenos Aires, e deputado mais votado nas eleições legislativas de 2013, quando bateu o kirchnerismo, Massa flertou com a vitória.

No ano passado, liderava as pesquisas de intenção de voto. Seu principal feito foi ter derrotado o intento dos aliados de Cristina Kirchner de propor uma nova reeleição da presidente.

Ex-ministro kirchnerista (2005-2009), foi tratado como "traidor da pátria" por governistas e simpatizantes de Cristina. Até hoje, tanto os governistas como Macri usam o seu passado, da adesão ao kirchnerismo à oposição, para criticá-lo.

Prensa Frente Renovador - 17.out.2015/AFP
Sergio Massa durante campanha em Jujuy no dia 17 de outubro
Sergio Massa durante campanha em Jujuy no dia 17 de outubro

Mas, depois disso, Massa caiu. Tentou negociar com Macri uma frente de oposição, mas o adversário não aceitou, alegando que ele ainda levava traços do kirchnerismo.

Com De la Sota, criou a coligação UNA (Unidos por uma Nova Argentina). Depois das eleições primárias, em agosto, a aposta era que perderia votos para os dois candidatos mais bem colocados. Mas isso não aconteceu.

Segundo a diretora do instituto de pesquisas Management & Fit, Mariel Fornoni, Massa apresentou o melhor desempenho entre os presidenciáveis desde agosto –aumentou em 50% seu capital eleitoral.

Seus aliados chegaram, nos últimos dias, a sugerir uma virada "à la Aécio Neves", em referência ao brasileiro que, de terceiro, foi para o segundo turno contra Dilma Rousseff na eleição do Brasil em 2014.

Nos últimos dias, Massa perdeu aliados, como o ex-candidato a governador Francisco de Narvaez, que foi para as fileiras peronistas de Scioli.

Massa respondeu com o tom agressivo que vem caracterizando sua campanha: "é um bêbado que perambula em busca da última dose".

A principal vitrine do terceiro colocado são as propostas (polêmicas) na área da segurança. Em um país onde a lembrança da violência da ditadura militar ainda é forte, propõe fortalecer as Forças Armadas e colocá-las no patrulhamento das áreas urbanas e das fronteiras.

Sugere também prisão perpétua para traficantes de drogas e estupradores e perseguição aos marajás do funcionalismo público.

Para o sociólogo Marcos Novaro, é um discurso de conveniência, mais do que um sinal de adesão à direita.

Eitan Abramovich/AFP
Daniel Scioli e a mulher, Karina Rabolini, no comício no Luna Park
Daniel Scioli e a mulher, Karina Rabolini, no comício no Luna Park

"Não acredito que Massa faça esse discurso de rigor à criminalidade porque seja conservador, mas sim porque enxerga nisso a possibilidade de roubar votos dos estratos mais baixos da população, fartos com a violência e com o mau serviço da polícia", diz.

Para Mariel Fornoni, é incerto o que farão os eleitores de Massa em um eventual segundo turno entre Scioli e Macri. "Acreditava-se que os eleitores peronistas iriam para Scioli, e a verdade é que Massa os reteve", diz.

Segundo o analista Ricardo Rouvier, cerca de metade dos seus eleitores é anti-kirchnerista, o que poderia beneficiar um fluxo para o opositor Macri.

A eleição, porém, não significaria o fim para Massa.

Segundo Fornoni, a expectativa é que seu partido siga como fiel da balança no novo congresso argentino, formado após as eleições, em que parlamentares governistas e da oposição deverão ter quase o mesmo número de cadeiras.

De novo, Massa seria a terceira força a desempatar o jogo.

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