Folha de S. Paulo


Presidente da Guatemala renuncia e é preso após acusações de corrupção

Acusado de ser um dos chefes de um esquema de corrupção, o presidente da Guatemala, Otto Pérez Molina, renunciou ao cargo nesta quinta-feira (3). Horas depois, ante um tribunal, ele ouviu um juiz ordenar sua prisão provisória, afirmando que o agora ex-mandatário poderia fugir em meio à investigação.

No início da noite, segundo a imprensa guatemalteca, Pérez Molina estava sendo levado para uma prisão militar na Cidade da Guatemala.

Ao apresentar a renúncia, ele disse que sairia para "preservar a institucionalidade da Presidência", enquanto responde ao processo -o Congresso retirou-lhe a imunidade na terça-feira (1º).

Os parlamentares confirmaram no cargo o juiz aposentado Alejandro Maldonado, que vinha exercendo a função de vice desde a renúncia de Roxana Baldetti.

Tanto Pérez Molina quanto Baldetti são apontados pela Justiça como participantes de uma rede chamada de "La Línea", na qual empresários pagavam propina para importar sem pagar impostos.

Ambos se dizem inocentes. Baldetti já estava presa.

O caso veio à tona em maio graças a uma investigação realizada pela Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala, órgão criado em parceria com a ONU, em 2007, e que atua sob fiscalização da Procuradoria.

A renúncia ocorre a poucos dias da eleição presidencial, no próximo domingo (6) -Pérez Molina não estava entre os candidatos, pois não há reeleição no país.

Agora, Maldonado deve governar até o fim do mandato do presidente, em 14 de janeiro.

AMADO E ODIADO

O personagem de Otto Pérez Molina, 64, é conhecido dos guatemaltecos há pelo menos trinta anos.

Nesse período, foi peça-chave do acordo de paz que encerrou a guerra civil (em 1996), protagonizou eventos cinematográficos como a primeira captura do narcotraficante Joaquín "Chapo" Guzmán (em 1993), recebeu acusações de assassinatos e violações de direitos humanos de grupos indígenas e se transformou no primeiro ex-militar a assumir a presidência da Guatemala, em 2012.

"Pérez Molina é, pura e simplesmente, um criminoso. É a encarnação de todo um conceito de governo mafioso que vem administrando a Guatemala por décadas", disse à Folha o escritor americano-guatemalteco Francisco Goldman, professor do Trinity College e colaborador da revista "New Yorker".

Centenas de milhares de pessoas lotaram as ruas das principais cidades do país para pedir a saída de Pérez Molina nos últimos meses.

Mas nem sempre o mandatário foi visto como vilão. Em 1983, foi um dos apoiadores do ministro de Defesa Óscar Mejía quando este organizou um golpe para derrubar o ditador Efraín Ríos Montt, hoje condenado por crimes contra a humanidade.

A passagem de Pérez Molina pelo Exército, porém, tem zonas cinzentas. Grupos de defesa de direitos humanos apresentaram denúncias por seu suposto papel em ações de contra-insurgência que teriam causado a morte de mais de 200 mil camponeses, a maioria de origem maia.

Entretanto, ao fim da Guerra Civil (1960-96), Pérez Molina estava entre integrantes da ala militar que queriam a saída negociada do conflito.

Em 2000, ele deixou o Exército e fundou o Partido Patriota, de direita conservadora, pelo qual tentou eleger-se, em 2007, sem êxito. Na votação seguinte, em 2011, obteve 54% dos votos.

Aumentando os gastos com policiamento, os índices de homicídios baixaram, de 41 por 100 mil habitantes, em 2010, para 38,6, no ano passado. Ainda é alto (o Brasil teve taxa de 25,2 por 100 mil em 2013), mas para os padrões da região, um avanço.

Pérez Molina lançou também o programa "hambre cero" (fome zero), aos moldes do brasileiro. Colheu bons resultados com relação ao investimento estrangeiro no país, que vem aumentando.


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