Folha de S. Paulo


China demonstra força com parada militar que marcará fim da 2ª Guerra

Mais de 10 mil homens, cem aviões e 500 equipamentos militares vão desfilar por Pequim nesta quinta-feira (3), em uma poderosa parada militar que celebra os 70 anos do fim da 2ª Guerra Mundial.

A festa do governo do presidente Xi Jinping, na verdade, é pela vitória na "guerra de resistência do povo chinês contra a agressão japonesa e a guerra mundial antifascista", o que abarca a invasão do Japão no país entre 1937 e 1945.

Filmes, livros, exposições e denúncias sobre atrocidades praticadas, à época, pelo Japão contra os chineses não saíram do noticiário nacional nos últimos meses. Histórias, por exemplo, sobre a exploração sexual de chinesas por tropas japonesas (as chamadas "mulheres de conforto" ) e sobre cruéis experiências médicas realizadas com capturados durante a guerra.

Apesar do forte tom anti-japonês, especialistas ouvidos pela Folha acreditam que a celebração desta semana não sirva como um ataque ao Japão, mas uma forma de fomentar o nacionalismo interno —e, assim, a relevância do Partido Comunista— e projetar a força da China no cenário internacional.

"A liderança do Partido Comunista chinês tenta mandar uma mensagem para os Estados Unidos (e outras nações aliadas na guerra) que a China fez uma grande contribuição para derrotar o fascismo e o militarismo e, assim, ganhou um lugar legítimo e de direção no sistema internacional", explica Amy King, pesquisadora da Universidade Nacional da Austrália e especialista da relação sino-japonesa.

Outra possível interpretação sobre o evento é o discurso que não está mais vigente o arranjo de poder em que países de fora da Ásia têm influência na região por meio do Japão. "O recado é: o século 20 na Ásia acabou. Agora é o século 21. Não é uma mensagem que Washington quer ouvir", diz Moss Roberts, professor do departamento de estudos do leste asiático da Universidade de Nova York.

Envolta em tanto simbolismo, essa será a primeira parada militar para festejar, sob o governo comunista, algo que não seja a subida ao poder do partido, em 1949, segundo a agência estatal de notícias Xinhua. Também é o primeiro grande desfile sob o comando de Xi Jinping.

Para garantir tranquilidade, veículos que entram em Pequim vêm sendo revistados, o aeroporto será fechado por algumas horas no dia da marcha e o acesso à rede privada virtual —usada para navegar por sites bloqueados no país— foi limitado. Além disso, fábricas foram fechadas na região e parte dos carros proibida de circular para garantir a estrela da festa: o céu azul e limpo de poluição.

BUSCA DA PAZ

Junto das tropas chinesas, cerca de mil soldados estrangeiros marcharão pela praça da Paz Celestial, palco do massacre de estudantes em 1989. A maior parte das armas exibida nessa demonstração de força revela "modernização e inovação" da produção nacional e nunca foi vista pelo público, promete o governo.

Para compor o cenário, são esperados líderes de 30 países, entre eles o presidente russo Vladimir Putin e o venezuelano Nicolás Maduro, e representantes de outros 19 —do Brasil deve comparecer o ministro da Defesa, Jaques Wagner, segundo a embaixada brasileira em Pequim. Ex-líderes também são aguardados, como o britânico Tony Blair e o alemão Gerhard Schroeder.

É improvável, no entanto, a presença dos principais presidentes europeus. Depois de muita especulação sobre sua presença, o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, alegou agenda interna e não participará.

Em repetidas declarações, o governo Xi tem afirmado que o ato não é direcionado contra o Japão ou os japoneses, e que não é uma afronta, mas uma celebração conjunta da paz.

"Para o publico externo, a China é muito cuidadosa de não enfatizar o aspecto anti-japonês da parada, afirmando que é um evento inclusivo, que todos os líderes são convidados, incluindo o Japão", diz Yanmei Xie, analista sênior do International Crisis Group.

O evento acontece poucas semanas após a aguardada fala de Abe sobre os 70 anos do final da guerra, em que o primeiro-ministro relembrou as desculpas oferecidas pelo Japão pela guerra, mas disse que as novas gerações não devem ser predestinadas a se desculpar. O discurso foi mal recebido pelos chineses, que esperavam desculpas pessoais de Abe.

Procurada, a embaixada do Japão em Pequim afirmou que não comentaria a celebração de quinta e disse que a política do Japão com a China envolve o conceito de relação benéfica mútua baseada em interesses estratégicos comuns.


Endereço da página:

Links no texto: