Folha de S. Paulo


Iranianos celebram acordo nuclear com euforia nas ruas e na internet

A notícia do acordo nuclear chegou a Teerã no início da tarde de uma terça-feira anestesiada pelo calor de 40 graus e pelo jejum do mês sagrado do ramadã. Autoridades reforçaram o policiamento em praças e ruas onde costuma haver celebrações populares, mas, até então, quase ninguém apareceu.

Foi o que relataram à Folha moradores de diversos bairros capital iraniana.

Contrastando com a morosidade das ruas, a euforia se espalhou rapidamente pelas redes sociais –bloqueadas, mas amplamente acessadas graças a programas antifiltros.

Alegria, alívio e orgulho eram os sentimentos dominantes dos iranianos, um povo ufanista que andava carente de alegrias coletivas.

"Graças à vontade do povo e ao trabalho dos negociadores, nuvens escuras e sanções deixarão o céu do Irã", escreveu uma iraniana no twitter, antecipando a volta triunfal da comitiva iraniana.

Editoria de Arte/Editoria de arte

O júbilo só se espalhou pelas ruas depois que as famílias terminaram o iftar, a refeição que marca o fim do jejum, ao anoitecer. Por causa do verão boreal e seus dias prolongados, isso aconteceu por volta das 20h30 locais.

A partir de então, milhares de pessoas saíram ruas para celebrar. Muitas dançavam e tinham o rosto pintado com as cores da bandeira nacional. Houve buzinaços nas principais vias de Teerã.

"O ambiente está carregado de esperança", diz o engenheiro Hamid R., 27, que fez parte do Movimento Verde, esmagado pelo regime por protestar contra supostas fraudes na reeleição do então presidente Mahmoud Ahmadinejad, em 2009.

Editoria de Arte

"Eu sabia que este dia chegaria", afirma o rapaz, fervoroso muçulmano, mas crítico dos ultraconservadores que ainda controlam o Judiciário e as forças de segurança.

Dono de um estúdio de fotografia, Nasser Joshaghani, 62, torce pelo fim rápido das sanções que fomentam inflação e sufocam a indústria petroleira. "Só quero que as pessoas tenham mais empregos e que a economia melhore."

Na imprensa favorável ao presidente Hasan Rowhani, o tom era de ufanismo. Alguns comentaristas governistas disseram que o acordo é uma derrota do "sionismo", termo oficial com o qual o Irã se refere a Israel.

Houve também reações mais cautelosas, como a do arquiteto Mohammad Masih Y. 27.

"É preciso ser paciente e observar quais serão os efeitos deste acordo na economia", afirma o rapaz, também religioso, que apoia setores mais conservadores do país.

"É importante lembrar que o Ocidente nos negou estes mesmos direitos há dez anos e, hoje, os arrancamos graças à nossa resistência. Nós, conservadores, pensamos que é resistindo ao Ocidente que se consegue marcar pontos."

A enfermeira aposentada Shohre B., 56, diz que o país está sendo enganado pela mídia oficial.

"Não acho que o acordo seja do nosso interesse, apesar do que martelam TVs e rádios. Nossos governantes apenas tiveram que recuar porque já não conseguiam mais avançar."

O jornalista SAMY ADGHIRNI foi correspondente no Irã de 2011 a 2014.


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