Folha de S. Paulo


Na Bolívia, papa homenageará jesuíta assassinado durante a ditadura

Ao desembarcar na tarde desta quarta-feira (8) no aeroporto de El Alto (grande La Paz), o papa Francisco homenageará o colega jesuíta Luis "Lucho" Espinal, assassinado em março de 1980, durante o tumultuado período de regimes militares na Bolívia.

A comitiva fará uma breve parada em uma avenida perto do local onde Espinal foi morto. Ali, Francisco deve abençoar uma cruz em homenagem ao religioso.

Misturado à multidão, estará ali também o sociólogo Xavier Albó, 80, padre jesuíta e catalão como Espinal.

Amigos, os dois chegaram à Bolívia na condição de missionários da Companhia de Jesus. Aos poucos, inspirados pela Teologia da Libertação, se envolveram com movimentos indígenas no anos 1960 e 1970, confrontando os sucessivos governos militares.

"Luis Espinal foi um mártir, um companheiro, muito, muito amigo meu. Quando penso em como tenho de ser cristão, sempre imagino o que ele faria", afirma Albó, em conversa por telefone com a Folha.

Diogo Shiraiwa/Editoria de Arte/Folhapress

Para o religioso, Espinal morreu no mesmo contexto que o bispo salvadorenho dom Óscar Romero, assassinado por um militar enquanto celebrava uma missa em 24 de março de 1980 —dois dias depois do padre jesuíta.

Em fevereiro, o papa Francisco aprovou a beatificação de dom Romero, declarando-o como mártir. Albó defende que Espinal receba o mesmo reconhecimento.

"Para a surpresa dos militares, 80 mil pessoas foram ao cemitério se despedir de Lucho. Isso o une a dom Romero como parte das reivindicações de tantos e tantos mártires dos anos 1970 e 1980 em toda a América Latina", disse Albó.

Ligado ao cinema e à comunicação, Espinal se envolveu com publicações de esquerda, principalmente o semanário "Aquí". Em dezembro de 1977, junto com Albó e lideranças mineiras, participou de uma ampla greve de fome de três semanas, que contribuiu para a queda do ditador Hugo Banzer (1971-78). O fim do período militar se daria apenas em 1982.

Na noite de 22 de março de 1980, Espinal foi sequestrado quando saía do cinema. Levado a um matadouro de animais, foi torturado e assassinado. Seu corpo foi encontrado em um caminho de terra. Tinha 48 anos.

A sua frase mais citada é esta: "Uma religião que não tem a valentia de falar em favor do homem tampouco tem o direito de falar de Deus".


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