Folha de S. Paulo


Visita à Bolívia expõe divergências entre papa e Evo Morales

Em uma visita que promete parar a Bolívia, o papa Francisco chega nesta quarta-feira (8) a La Paz com dois temas espinhosos para tratar com o presidente Evo Morales: ambiente e a tumultuada relação entre seu governo e a Igreja Católica no país.

A visita de três dias começa à tarde na capital boliviana. A cerca de 4.000 m acima do nível do mar, Francisco será recebido por Evo, desfilará em carro aberto e fará seu primeiro discurso no país.

No mesmo dia, o papa viaja a Santa Cruz de la Sierra, onde fará uma missa campal e visitará um presídio, entre outras atividades. Na sexta (10), vai ao Paraguai, o terceiro e último país do giro que começou pelo Equador.

Alessandro Bianchi/Reuters
O papa Francisco (centro) chega ao parque Bicentenário, em Quito (Equador), para celebrar missa
O papa Francisco (centro) chega ao parque Bicentenário, em Quito (Equador), para celebrar missa

Há 27 anos sem receber um papa (o último foi João Paulo 2°), o país, de maioria católica, não economizou nas medidas: com a previsão de centenas de milhares de fiéis nas ruas, Santa Cruz e La Paz decretaram feriado e proibiram a venda de bebida alcoólica durante os dias de visita.

Mas o encontro privado de Francisco com Evo promete ser tão complexo como administrar as multidões. Semanas após lançar uma encíclica abertamente ambientalista, o papa encontrará um presidente que tem acelerado a exploração de recursos naturais.

Nesta terça (7), ainda no Equador, Francisco falou sobre a obrigação de preservar a natureza em projetos de exploração econômica.

No início de seu governo, em 2006, Evo se apresentava como líder ambientalista e evocava a divindade andina Pachamama ("mãe terra"). Mas a dependência dos recursos naturais –gás e minerais somaram 67% das exportações da Bolívia em 2014– fez com que mudasse o discurso.

Recentemente, ao autorizar a exploração de gás e petróleo em parques nacionais, Evo afirmou que as reservas florestais "foram criadas pelo império norte-americano".

"Os países do norte querem que sejamos seus guardas-florestais. Destruíram seu ambiente e agora os países dos sul temos de cuidar para eles", disse, em junho.

"O discurso do papa é um, e o do presidente é outro", disse à Folha o padre jesuíta e sociólogo Xavier Albó. "O ambiente será motivo de controvérsia e desencontro, mas acredito que Francisco vá saber lidar com isso."

CRISES CÍCLICAS

Outra missão difícil de Francisco será melhorar as relações entre a igreja e Evo.

O momento mais crítico foi durante a Assembleia Constituinte. Por iniciativa do partido do presidente, o MAS (Movimento ao Socialismo), o catolicismo deixou de ser a religião oficial da Bolívia, que se tornou um Estado laico.

Isso significou o fim do ensino católico obrigatório nas escolas, o que motivou duras críticas da igreja. Em 2009, Evo disse que a "Igreja Católica é um símbolo do colonialismo europeu e, portanto, deve desaparecer da Bolívia".

Um ano depois, porém, em visita a Bento 16, afirmou que se considerava católico, mas criticou a cúpula da igreja na Bolívia, principalmente o cardeal Julio Terrazas, visto como aliado da oposição.


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