Folha de S. Paulo


Radicais 'justificam' ataque que fez 38 mortos em balneário na Tunísia

O professor escolar Walid, 35, não concorda com as ações de Saif Rezgui, 23, que na sexta-feira (26) atirou contra turistas no balneário de Sousse, no sul da Tunísia, deixando 38 mortos.

Mas ele diz entender as suas razões.

"Por que os turistas nadam pelados se sabem que somos muçulmanos? Por que bebem? Estão nos provocando", diz à reportagem da Folha, diante da mesquita do bairro popular de Riyadh.

Diogo Bercito/Folhapress
Flores diante do local do ataque contra turistas em Sousse, na Tunísia
Flores diante do local do ataque contra turistas em Sousse, na Tunísia

São perguntas que evidenciam o conflito entre os setores moderados e os ultraconservadores na Tunísia –como os salafistas, que seguem uma leitura rigorosa do islã.

Com a deposição do ditador Zine El Abidine Ben Ali, em 2011, a Tunísia viveu um período de relaxamento do controle a grupos mais radicais, quando os salafistas expandiram a sua influência.

"É normal que, em uma fase de transição de um sistema autoritário a um processo de democratização, todas as vozes encontrem mais espaço para manobra", diz o pesquisador Stefano Torelli.

Foram diversos os embates. Houve manifestações contra o que salafistas entendiam como "blasfêmias", incluindo a exibição do filme "Persepolis". Um encontro na cidade de Kairouan –do qual Walid tinha planos de participar, em 2013– foi impedido pelo governo local.

O salafismo é uma ideologia que defende o retorno às origens do islã.

Na Tunísia, uma de suas principais forças é o Ansar al-Sharia, considerado uma organização terrorista pelo governo desde 2013. Esse grupo diz ter recrutado 70 mil membros.

Não há indícios sobre a participação do Ansar al-Sharia no atentado da semana passada, reivindicado pelo Estado Islâmico. Mas moradores ouvidos pela reportagem sugeriram que as atividades do grupo pudessem ter influenciado o atirador, que estudava em Kairouan, um de seus bastiões.

Nesta segunda (29), o governo anunciou a prisão de um grupo de suspeitos de participar do ataque. As autoridades investigam, agora, como a ação foi planejada.

REFEIÇÃO SEGREGADA

A ideia da separação entre moderados e ultraconservadores tem uma representação bastante literal no restaurante Kolla, em Sousse.

Um biombo divide os salafistas dos demais clientes. "Estamos abertos a todos", diz o dono, Hamouda Bin Ayed, 58.

A ideia de criar um espaço amigável a setores mais conservadores rendeu clientes a Ayed, desde que abriu seu estabelecimento em 2011.

Por causa da fama de "restaurante salafista", Ayed já foi interrogado pela polícia diversas vezes. Ele diz não ser salafista.

"Costumo me sentar com eles [salafistas] para saber o que pensam. Não concordo, mas respeito a opinião deles", afirma Ayed.


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