Folha de S. Paulo


Teólogo da Libertação participa de evento no Vaticano pela 1ª vez

Quarenta e quatro anos depois de publicar o livro que batizou a Teologia da Libertação, o teólogo peruano Gustavo Gutiérrez, 86, participou pela primeira vez de uma cerimônia oficial no Vaticano, nesta terça-feira (12).

O convite é parte da aproximação do papa Francisco com a corrente de origem latino-americana que defende uma igreja voltada aos pobres e foi perseguida durante o papado de João Paulo 2º (1978-2005) por se alinhar com movimentos de esquerda em plena Guerra Fria.

Gutiérrez afirmou que está feliz com a "mudança na atmosfera" no Vaticano, mas disse que não se trata de uma reabilitação, porque "significaria que teria havido uma desabilitação antes."

Diferentemente de outros teólogos da Teologia da Libertação, como o brasileiro Leonardo Boff, Gutiérrez nunca foi formalmente punido pelo Vaticano.

No discurso, Gutiérrez elogiou a opção por uma igreja mais próxima aos pobres feita por Francisco e enfatizou que se trata de um tema atual.

"Estamos na era pós-socialista, pós-capitalista e pós-industrial. As pessoas gostam de dizer que estamos na era 'pós'. Mas nós não estamos na era pós-pobreza."

APROXIMAÇÃO

Um dos principais nomes da teologia no Brasil, o escritor Frei Betto afirma que o papa Francisco tem buscado se aproximar do movimento.

"Gutiérrez já havia sido recebido pelo papa, em 2013. Francisco me recebeu, em audiência pública, mas para breve conversa pessoal, em abril do ano passado. Ou seja, quer sinalizar que considera a Teologia da Libertação importante na Igreja Católica, ao contrario de seus antecessores", disse à Folha.

Ele mencionou também a beatificação, no próximo dia 23, do arcebispo salvadorenho Óscar Romero, assassinado em 1980, e a recente abertura do processo de canonização de dom Helder Camara (1909-1999), arcebispo do Recife e de Olinda.

Também ligado à Teologia da Libertação, o padre e historiador José Oscar Beozzo afirma que Francisco está colocando a igreja "de volta aos trilhos" ao abrir espaço para diferentes teologias.

"A igreja sempre foi cuidadosa em não impor uma teologia, em deixar o teólogo se arriscar, o que não aconteceu nos últimos 30 anos."

Beozzo afirma que a abertura promovida por Francisco tem facilitado, no Brasil, a organização de eventos ligados à Teologia da Libertação, até recentemente perseguidos pela própria Cúria.

Apesar de argentino, o papa Francisco, 78, nunca foi próximo da Teologia da Libertação e já a criticou algumas vezes ao longo dos anos, inclusive depois de se tornar sumo pontífice.

Em discurso a bispos durante visita ao Brasil, em julho de 2013, Francisco criticou a "ideologização" da igreja por tendências que variam da "categorização marxista" até o "restauracionismo de formas superadas".


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