Folha de S. Paulo


Justiça rejeita pela 2ª vez denúncia de Nisman contra Cristina Kirchner

A Justiça argentina voltou a rejeitar a denúncia do promotor morto Alberto Nisman contra a presidente Cristina Kirchner e seus aliados.

O inquérito já havia sido rejeitado pelo juiz Daniel Rafecas, no fim de fevereiro. Nesta quinta (26), a Câmara Federal -uma espécie de segunda instância- também decidiu pelo encerramento da investigação.

Dois juízes votaram por rejeitar o processo e um foi favorável à denúncia.

A Promotoria poderá recorrer mais uma vez à Justiça, dessa vez na terceira instância, na Câmara de Cassação Penal.

Na decisão, os dois juízes consideraram que a denúncia não traz evidências de que houve delito.

Nisman acusava Cristina Kirchner, o chanceler Héctor Timerman e aliados políticos de tentarem encobrir supostos responsáveis iranianos de um atentado na Argentina, em 1994.

Em troca, a Argentina teria vantagens comerciais: poderia vender grãos ao Irã e comprar petróleo mais barato.

A Argentina firmou um memorando de entendimento com o Irã em 2013. Segundo o governo Kirchner, o objetivo era tentar interrogar cinco suspeitos iranianos em seu país.

O acordo, porém, nunca prosperou, pois a Justiça do Irã e a da Argentina o consideraram inconstitucional.

Nisman afirmava que as conversas entre os dois países começaram antes, em 2011, e seriam tocadas também por representantes paralelos, como o ex-sindicalista Luis D'Elia e o suposto espião do Irã Jorge Youssef Khalil.

O memorando, na versão de Nisman, seria apenas uma fachada para os verdadeiros interesses dos governantes.

A Argentina receberia fôlego econômico, e o Irã, a retirada dos alertas vermelhos da Interpol contra importantes autoridades, entre elas o ex-ministro da Defesa Ahmad Vahidi e o ex-chanceler Alí Akbar Velayati, que chegou a ser cotado para substituir Mahmoud Ahmadinejad.

Os juízes argumentaram, porém, que o memorando nunca produziu efeitos práticos, e o principal indício de crime, a suposta tentativa de retirada dos alertas vermelhos, não foi alcançado.

O único juiz que votou a favor da denúncia afirmou que as suspeitas têm verossimilhança e devem ser investigadas, pois não significam que tal objetivo tenha sido tentado.

LÍDERES JUDEUS CRITICAM

Líderes da comunidade judaica na Argentina criticaram a decisão da Justiça de encerrar o caso.

Os diretores do Centro Wiesenthal, entidade global que combate o antissemitismo, convocou parlamentares a organizarem uma comissão de investigação independente para analisar as denúncias de Alberto Nisman.

O promotor apareceu morto há cerca de dois meses, pouco depois de apresentar a acusação contra a presidente Kirchner.

"Transcorridos dois meses, a Justiça argentina ainda não conseguiu determinar se Nisman se suicidou ou se foi assassinado. Entretanto, foi veloz em invalidar sua denúncia", criticou nota divulgada pela entidade.

O comunicado afirma ainda que rejeitar uma denúncia sem promover nem sequer uma investigação "turva ainda mais as motivações do memorando de entendimentos entre os dois países [Irã e Argentina]".

"A motivação iraniana era a impunidade absoluta. A da Argentina está coberta por um véu de mistério que obstrui toda chance de se alcançar a Justiça", afirmou Shimon Samuels, diretor de relações internacionais do Centro Wiesenthal.


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