Folha de S. Paulo


Veteranos de guerra nos EUA têm dificuldade de conseguir emprego

"Para todos os presidentes de empresas nos Estados Unidos, eu repito: se você quer alguém que faça o trabalho direito, contrate um veterano."

A frase parece saída de um anúncio de uma agência de empregos para ex-militares, mas foi dita pelo presidente Barack Obama durante seu mais importante discurso do ano, em janeiro.

"Enquanto uma nova geração de veteranos volta para casa, nós devemos a eles a oportunidade de viver o sonho americano que ajudaram a defender", disse Obama.

Desde os ataques terroristas do 11 de setembro de 2001, durante o período conhecido como Guerra ao Terror, os EUA começaram guerras no Iraque e no Afeganistão.

Com o fim oficial dessas operações, os cerca de 2,8 milhões de veteranos dos conflitos enfrentam o desafio de se readaptar à sociedade civil e achar um novo emprego.

Segundo o Departamento do Trabalho, o índice de desemprego entre veteranos do pós-11 de Setembro ficou em 6,7% em fevereiro, acima da média nacional, de 5,5%.

Os números estão melhorando –há um ano, a taxa era de 9,2%–, graças a um esforço de governo e organizações privadas para aumentar a contratação de homens e mulheres que deixaram o serviço militar. Hoje empresas que contratam veteranos têm, por exemplo, benefícios fiscais.

"Nos últimos dois anos, tivemos um crescimento anual de 35% na empresa, porque há uma demanda tremenda por veteranos", afirma Peter Gudmundsson, presidente da Recruit Military, que faz a intermediação entre as companhias e os veteranos.

FALTA DE PREPARO

Mas, para Carl Castro, do Centro de Pesquisa e Inovação para Veteranos e Famílias Militares da Universidade do Sul da Califórnia, essa é uma realidade distorcida.

"Muitos dos empregos oferecidos não interessam aos veteranos, justamente porque eles querem fazer algo diferente. E a maioria das coisas que aprenderam enquanto serviam não se traduzem diretamente em habilidades para o mercado de trabalho."

Além disso, diz, boa parte dos veteranos não está preparada para emprego algum.

Steven Millar, 29, passou dois anos no Iraque como soldado da infantaria. Ao voltar aos EUA, inscreveu-se em um dos programas do governo para financiar seus estudos. Passou por cursos de administração de empresas, culinária e personal training e já teve quatro empregos.

"Eu ainda estou tentando me adaptar à vida civil, cinco anos depois de deixar o Iraque", contou à Folha.

Para ele, as ofertas de emprego a veteranos não interessam. "É difícil para quem não quer ser um policial ou trabalhar em empresas do setor de defesa. Eu quero recomeçar, ter a vida de um americano comum."

Brock McIntosh, 27, veterano do Afeganistão, diz que a experiência no serviço militar não é o que os empregadores interessantes buscam num candidato. "Eles querem MBAs, PhDs, e muitos de nós saíram da escola direto para o Exército. E, ao voltar, mesmo com a ajuda financeira do governo, vários veteranos não terminam a faculdade."

Segundo ele, é difícil voltar da zona de guerra e entrar numa sala de aula com colegas mais novos e experiências radicalmente diferentes.

Além disso, afirma, muitos veteranos se casaram ou tiveram filhos durante o serviço militar, o que dificulta o acesso ao estudos.

"Para mim, voltar foi muito estranho. Você é recebido por pessoas acenando, aplaudindo. Mas 90% delas nem saberiam apontar o Afeganistão no mapa ou dizer contra quem estamos lutando –e, ainda assim, somos heróis", diz ele, que hoje faz parte de uma organização antiguerra.

E, ao tentar falar sobre o assunto, ele percebeu que as pessoas não querem saber ou ficam desconfortáveis em ouvir sobre a guerra. "Então você simplesmente não fala."

"Muitos pensam que, só porque as guerras no Afeganistão e no Iraque acabaram, tudo vai voltar ao normal imediatamente. Mas não vai –isso vai levar anos. Os desafios não apenas não estão acabando como a maior parte deles está só começando", afirma Carl Castro.


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