Folha de S. Paulo


Obama retoma relação com Cuba após 'fracasso' do isolamento

Em uma aproximação histórica entre dois grandes adversários da Guerra Fria, o presidente Barack Obama e o ditador Raúl Castro anunciaram a normalização das relações diplomáticas entre EUA e Cuba, rompidas desde 1961.

"Vamos deixar para trás os legados do colonialismo e do comunismo", disse Obama nesta quarta (17) às 12h (15h de Brasília). Em espanhol, afirmou que "todos somos americanos". "Devemos respeitar e reconhecer a atitude de Obama", disse Raúl, no mesmo horário.

"Hoje começamos um novo capítulo da relação entre os dois países. O isolamento por cinco décadas não funcionou", disse Obama, acrescentando que "temos relações com a China há 35 anos, e há duas décadas reatamos com o Vietnã".

Doug Wills/Reuters
Presidente Barack Obama anuncia mudança histórica da política dos EUA em relação a Cuba
Presidente Barack Obama anuncia mudança histórica da política dos EUA em relação a Cuba

Os EUA eram o único país do hemisfério sem relações diplomáticas com a ilha. Obama anunciou que reabrirá a embaixada americana em Havana e facilitará viagens, exportações, envio de remessas e transações financeiras de americanos em Cuba.

Na terça (16), Obama e Raúl conversaram 45 minutos por telefone, no primeiro diálogo significativo entre líderes dos dois países em 54 anos. Em um dia cheio de anúncios com o enunciado "pela primeira vez", tanto a Casa Branca quanto o Departamento de Estado insinuaram que Obama e o secretário John Kerry podem fazer uma inédita visita a Cuba no ano que vem.

Funcionários do Departamento de Estado disseram à Folha que esperam uma "melhoria" das relações dos EUA com os demais países latino-americanos, que sempre cobraram a normalização.

Havia um temor do fracasso da próxima Cúpula das Américas, em abril, no Panamá -por pressão dos vizinhos, Cuba foi convidada a participar, o que poderia retirar os EUA do encontro.

Sanções contra Cuba e o embargo americano foram aprovados entre 1960 e 1962, quando propriedades americanas estimadas em bilhões de dólares foram expropriadas pela revolução comunista liderada por Fidel Castro.

Desde 1982, Cuba está em uma lista de "países que patrocinam o terrorismo", mas o Departamento de Estado começou a revisão para retirar o país dessa lista.

Para o fim do rompimento, foram necessários quase dezoito meses de negociações secretas no Canadá e no Vaticano, tendo o papa Francisco e o governo canadense como intermediários, e uma troca de prisioneiros.

Obama não pôde anunciar o fim do embargo, decisão que depende de aprovação do Congresso americano, mas sua atitude foi considerada o início do fim dele. O Congresso entrou na terça (16) em recesso de Natal.

O maior entrave para a normalização das relações era a prisão, desde 2009, de Alan Gross, funcionário terceirizado de uma agência americana que levava equipamentos de telecomunicação à oposição cubana.

O governo cubano aceitou liberar Gross e ainda soltou um outro espião americano, preso há 20 anos na ilha, cuja identidade não foi revelada. Além disso, 53 presos políticos também foram libertados em Havana.

Do lado americano, foram libertados três espiões cubanos, Gerardo Hernández, Antonio Guerrero e Ramón Labañino. Eles monitoravam a a comunidade cubano-americana na Flórida e foram presos em 1998.

Pequenos protestos no bairro de Little Havana, marco zero da comunidade exilada em Miami, ocorreram nesta quarta, e políticos cubano-americanos atacaram o diálogo com um "regime brutal".

Raúl Castro disse que os dois países ainda têm "diferenças profundas", e Obama afirmou que os EUA continuariam a pressionar por "democracia e direitos humanos" na ilha. A aproximação entre os países, separados por 144 km de mar, começou no primeiro ano da gestão Obama, em 2009, quando viagens de americanos e remessas foram facilitadas.


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