Folha de S. Paulo


Populismo com responsabilidade fiscal de Evo Morales surpreende

"Populista responsável" é o rótulo que recebeu o presidente boliviano Evo Morales de Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano, centro de estudos norte-americano.

É uma qualificação perfeitamente aceitável desde que a palavra "populista" seja despida da conotação pejorativa ou negativa que ganhou no mundo.

Há, de fato, populistas que não passam de demagogos baratos, mas há populistas que são, na verdade, populares, porque suas políticas beneficiam as maiorias.

Evo Morales é um deles. Seu êxito na redução da pobreza é conhecido e certamente influiu poderosamente para que obtivesse um terceiro mandato presidencial no pleito deste domingo, 12.

Um dado basta para ilustrar esse êxito: segundo o Fundo Monetário Internacional, inimigo público número 1 do populismo, o crescimento da renda dos 40% mais pobres foi maior na Bolívia do que em qualquer outro país latino-americano no período que vai de 2002 a 2012 (Evo é presidente desde 2006).

Essa fatia da população viu sua renda crescer 11%, praticamente o dobro do registro brasileiro nesse mesmo período (durante a badalada era Lula), que foi de 6%.

Menos conhecida é a responsabilidade fiscal que caracteriza seu período de governo: as receitas superaram as despesas em 1 ponto percentual, na média dos seis anos mais recentes.

Em parte por isso, a inflação está sob controle: foi até negativa em setembro (-0,38%) e, no ano (até setembro), não passou de 3,49%.

Ou seja, ela estaria abaixo do centro da meta, se a Bolívia também tivesse uma política de metas de inflação com os mesmos objetivos do Brasil (4,5% com tolerância de dois pontos para mais ou para menos).

Claro que os êxitos do período Evo se devem, em boa medida, à boa fortuna de contar com preços elevados do gás, seu principal produto de exportação, que triplicaram desde 2005.

Mas a Venezuela de outros populistas (Hugo Chávez e Nicolás Maduro) também viu o preço do petróleo subir e não soube aproveitar a bonança. Ao contrário, está mergulhada em uma enorme crise, com inflação altíssima e desabastecimento.

Evo, ao contrário de Maduro/Chávez e também de Néstor e Cristina Kirchner na Argentina, soube reconquistar a confiança do empresariado, depois de uma crispação inicial que levou até a ensaios de emancipação da Província de Santa Cruz, centro econômico do país.

Tudo somado, não há a menor surpresa no fato de Evo Morales estar se transformando, com a eleição deste domingo, no presidente que mais tempo ficará no poder em um país antigamente folclorizado pela instabilidade institucional.


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