Folha de S. Paulo


Teleférico em La Paz vira trunfo eleitoral para Evo Morales na Bolívia

Depois de ser ajudado por um funcionário da estação Ajayuni, Felipe Kawayu, 72, acomoda-se dentro da cabine do teleférico. "Daria para descontar uns cinco anos da minha vida só com o tempo que passei dentro de lotações, subindo e descendo, para ir trabalhar. Com o teleférico, chego em casa em 15 minutos", diz à Folha.

Ao lado dele, um homem mais jovem, de óculos e olhos grudados num smartphone, concorda só balançando a cabeça.

Enquanto isso, duas turistas francesas apontam, pelo vidro, a sequência de casas simples, escolas, crianças jogando futebol, até a zona de 16 de Julio, onde ocorre aos domingos o mercado popular local.

Com o acesso facilitado pelo transporte, a feira virou um destino turístico que atrai, principalmente, europeus e norte-americanos.

O sucesso do teleférico que une as cidades de La Paz a El Alto, duas das maiores aglomerações da Bolívia (900 mil habitantes e 1 milhão, respectivamente), é um dos trunfos do atual presidente Evo Morales, favorito para conquistar seu terceiro mandato no próximo domingo (12).

Considerado o maior em extensão do mundo em área urbana, com 10,3 km, o teleférico foi inaugurado em maio.

A inauguração da terceira linha, que terá wi-fi nas cabines, em setembro, transformou-se em grande ato eleitoral em El Alto, cidade que já foi epicentro de grandes conflitos políticos violentos.

"As razões por que votamos em Evo são muito concretas: o teleférico é uma delas, a diminuição da idade para aposentadoria [de 65 para 60] é outra", afirma Juan Granado, 56, que deixou, nos anos 80, uma área de mineração no norte da Bolívia por causa da queda do preço do metal no exterior. Chegou a El Alto para buscar um emprego na construção, de olho nos melhores salários da região metropolitana. "Não dava para imaginar como a Bolívia mudaria tanto", explica.

Enquanto a cabine sobe silenciosamente, podem-se ver militantes do MAS (Movimento ao Socialismo, partido de Evo) panfletando lá embaixo. Praticamente nada dos demais partidos.

David Mercado - 25.set.2014/Reuters
Teleférico construído pelo governo de Evo Morales entre La Paz, capital boliviana, e El Alto
Teleférico construído pelo governo de Evo Morales entre La Paz, capital boliviana, e El Alto

Segundo pesquisa divulgada no fim de semana, o atual presidente tem 57% das intenções de voto. Seu adversário mais próximo, o empresário Samuel Doria Medina, está em distantes 17,9%.

A Constituição do país, promulgada em 2009, estabelece apenas uma reeleição.

Desse modo, Evo, por ter vencido em 2005 e 2009, não poderia concorrer mais uma vez.

Porém, a Corte Suprema boliviana concluiu no ano passado que, pelo fato de o primeiro mandato ter ocorrido antes da nova Carta, o presidente estaria liberado para concorrer a mais um período.

"Vou respeitar a lei", respondeu, lacônico, às perguntas do jornal "El País" sobre se concorreria ao cargo novamente.

"Acho que um presidente não pode ter mais de 60 anos, falta energia", disse Evo, que no fim do mês completa 55 anos.

A oposição critica a construção do teleférico –segundo Doria Medina, feita de forma ilegal. "Não foi realizada licitação, como diz a lei, e outras empresas reclamaram."

O governo admite ter contratado diretamente a austríaca Doppelmayr para o projeto, que custou US$ 244 milhões e foi financiado pelo Tesouro, com crédito do Banco Central da Bolívia.

Porém, argumenta que o teleférico encaixa-se num dos casos de interesse público determinados pela Constituição em que se faculta ao governo fazer ou não contratação direta.

Editoria de Arte/Folhapress

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