Folha de S. Paulo


Tortura é prática comum de forças de segurança da Nigéria, diz relatório

A tortura e os maus tratos a presos são práticas comuns das forças de segurança da Nigéria, de acordo com relatório publicado pela Anistia Internacional nesta quinta (18).

Segundo a entidade, que de 2007 a 2014 visitou prisões nigerianas e entrevistou pessoas que estiveram presas, os relatos de tortura no norte do país aumentaram consideravelmente nos últimos cinco anos, quando começou uma operação militar de combate à milícia islâmica Boko Haram.

O número de vítimas de tortura por forças policiais e militares nesta operação é estimado entre 5.000 e 10 mil. Grande parte destas pessoas, acusadas de ter ligações com a facção, foi submetida a diversos tipos de maus tratos, como espancamento, extração de dentes e unhas, estupro e outras formas de violência sexual.

Segundo o relatório, a maioria das vítimas não têm acesso a defesa jurídica durante a detenção e muitas vezes são obrigadas a pagar propinas para serem liberadas. Por meio de tortura, policiais extraem confissões de crimes.

Em um dos relatos obtidos pela Anistia Internacional, Diolu, 26, descreve detalhadamente os maus tratos que sofreu quando foi preso sem saber o motivo e sem acesso a advogado.

"Eles me torturaram até eu perder o controle, até eu entrar em colapso. Eu desmaiei. Mais tarde acordei e me encontrei numa piscina de sangue", contou Diolu à entidade. "Quando eles viram que eu estava acordado, me mandaram recolher o meu sangue e comê-lo."

GUERRA AO TERROR

A situação piorou em 2012, quando o governo nigeriano decretou pela primeira vez estado de emergência para o combate ao Boko Haram, que domina territórios no nordeste do país.

De acordo com o porta-voz da Anistia Internacional para o tema no Brasil, Maurício Santoro, o caso nigeriano faz parte de uma tendência de flexibilização de atividade policial e militar no combate a instituições terroristas.

"O Boko Haram é um grupo que tem terrível histórico de violações de direitos humanos e tem que ser enfrentado. O nosso questionamento é o uso da tortura como método de combate a esse tipo de grupo", disse Santoro à Folha.

"O que a gente observa nesta última década, pós-11 de setembro, é o uso constante da tortura em situações que envolvam suspeita de terrorismo", comenta.

Relatos ouvidos pela instituição descrevem como a polícia captura pessoas em mesquitas para conseguir informações sobre o Boko Haram.

"Nós fomos colocados em um veículo Hilux e levados à "Guantanamo" [da cidade de] Damaturu" disse Ahmed. "Os soldados nos jogaram no carro um em cima do outro, de 10 a 20 pessoas por carro. Como alguns estavam em cima dos outros, alguns morreram antes de chegar a Damaturu", disse.

Entretanto, a violência policial e militar na Nigéria não acontece apenas na operação contra o Boko Haram. A prática acontece também na investigação de crimes comuns, embora a Nigéria seja signatária de tratados internacionais contra a tortura.

De acordo com a Anistia Internacional, falta à Nigéria uma lei que criminalize a tortura, além de investigações independentes sobre as denúncias de abusos cometidos por órgãos governamentais e outras medidas para coibir a prática.


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