Folha de S. Paulo


Hostilizados em seus países, jovens judeus europeus mudam para Israel

Marc Leiba, 31, colocou na balança durante o ano passado dois de seus traços de identidade: ser "francês" e ser "judeu". Quando sentiu que a religião tinha mais peso, decidiu sair da França e emigrou a Israel, onde vive.

"Eu vi que ser judeu, que é uma coisa pessoal, me definia mais do que ser francês", diz à Folha. "Saí da França porque acho que os judeus não têm futuro ali."

Kenzo Tribouillard - 2.ago.2014/AFP
People stage a scene as demonstraters hold a banner reading
Durante manifestação contra operações em Gaza pessoas seguram cartaz em que se lê "Boicote Israel"

A conclusão não é só dele. Leiba é um dos milhares de judeus que, diante do antissemitismo em ascensão, têm deixado o continente europeu e migrado para Israel.

Contra antissemitismo, governos mudam até nomes de cidades

O caso francês é agudo. No primeiro semestre de 2013, 811 judeus franceses fizeram a "aliyah" -emigração a Israel. No mesmo período deste ano, foram 2.831.

O conflito entre Israel e militantes da facção palestina Hamas motivou, na França, diversas manifestações contrárias ao governo israelense, respingando também na população judaica.

De acordo com Yonathan Arfi, vice-presidente da federação de judeus na França, oito sinagogas foram atacadas em Paris em julho, mês do início da operação militar Margem Protetora, em Gaza. "Pela primeira vez, tivemos gangues atacando sinagogas. Até então, esses crimes eram cometidos por indivíduos."

CRESCENTE
A tendência, diz Arfi, ganhou força nos anos 2000, quando já se pensava que o antissemitismo estava em rápido declínio na Europa, décadas depois do Holocausto.

O início da Segunda Intifada, revolta violenta de palestinos contra Israel, motivou ataques a sinagogas e judeus no continente. Em 2006, um garoto foi sequestrado e morto por ser judeu. Em 2012, um atirador matou quatro em uma escola judaica.

Arfi nota que, se no passado o antissemitismo era uma causa da direita europeia, o preconceito foi adotado também pela periferia. "As populações pobres consideram os judeus o rosto do sistema."

A francesa Leah Stora, 24, que também emigrou a Israel, diz nunca ter sido alvo de antissemitismo. Ela se mudou por discordar da "atitude individualista" na França. "Eu nunca tive medo de andar nas ruas de Paris. Se você não é religioso, as pessoas nem sabem que você é judeu." Mas Stora conta, também, que ouvia frases como "vocês, judeus, mataram Jesus".

A comunidade judaica na França é numerosa -cerca de 600 mil-, e os que fazem a "aliyah" ainda são uma pequena parcela.

COLETIVO
A Espanha, de onde judeus foram expulsos em 1492 por decreto real, tem atualmente uma pequena população judaica. Procurado pela Folha, o Ministério do Interior relatou apenas três incidentes antissemitas em 2013, incluídos pela primeira vez nesse ano como "crimes de ódio".

Mas, de acordo com a federação judaica espanhola FCJE, "os preconceitos antigos seguem existindo e aumentando nos últimos anos, tomando novas formas".

"Não temos um grande volume de ataques a pessoas ou propriedades", diz a diretora Carolina Aisen, "mas há aumento do antissemitismo no âmbito educativo, especialmente universidades, e nos meios de comunicação."

"Há um antissemitismo no inconsciente coletivo. É um profundo desprezo pelo judeu que se demonstra em expressões como "judiar" e em festas populares que tratam da difamação de judeus."

Na Escócia, Jonathan Litewski, 26, arrecada dinheiro para financiar sua emigração a Israel. "Não aguento mais morar em Edimburgo."

Litewski também reúne fundos para ir à Justiça contra sua recente demissão de uma loja de móveis. Ele diz ter sido dispensado por usar uma estrela de Davi no pescoço e ter contado à chefe seu plano de se juntar ao Exército israelense.


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