Folha de S. Paulo


Palestinos vencem calor e mau cheiro para voltar às suas casas durante trégua

Palestinos venceram o calor, os destroços e o cheiro de carne podre para voltar neste sábado (26), a pé, aos destroços de suas casas em regiões como Shujaya (leste) e Beit Hanun (norte), enquanto vigora a trégua humanitária de 12 horas iniciada em Gaza às 8h locais (2h, em Brasília).

O cessar-fogo, ainda em andamento, foi acordado nesta sexta-feira (25) por Israel e pela facção palestina Hamas, após intensa pressão diplomática, em especial por articulação do secretário de Estado americano John Kerry.

Marco Longari/AFP
Palestinos carregam corpo de homem morto em Beit Hanun, no norte de Gaza, durante cessar-fogo
Palestinos carregam corpo de homem morto em Beit Hanun, no norte de Gaza, durante cessar-fogo

Seguem adiante os esforços para que o cessar-fogo se prolongue ao menos por uma semana.

Com a segurança da trégua humanitária, ambulâncias entraram nas áreas de mais violento confronto e retiraram dali dezenas de corpos, fazendo a cifra de mortos palestinos ultrapassar mil vítimas. Há também 37 soldados israelenses mortos. Ao menos 85 corpos foram encontrados hoje entre escombros na faixa de Gaza, segundo um balanço divulgado por equipes de resgate palestinas.

Shujaya, ao leste, encontrava-se reduzida a escombros pelo bombardeio israelense. Toda a região fora transformada em destroços. Enquanto cadáveres eram retirados dos escombros, o odor de carne podre contaminava o ar.

A reportagem da Folha encontrou, ali, Walid Habib, que retornara durante a manhã para descobrir o que restava da casa de sua família, com seis andares: pertences que cabiam em um saco de lixo, que ele carregava de volta até a cidade de Gaza.

"Isso é reflexo do fracasso de Israel em destruir o Hamas", diz. "Não conseguem matar os líderes da resistência, então atacam civis."

Abu Arif cruzava, com pressa, as ruas de Shujaya carregando entre os braços uma TV de LED quase intacta, uma imagem curiosa entre a destruição. Foi tudo o que pôde tirar de casa, diz. "Não sei se ainda funciona."

Atif al-Helu resgatou, em duas horas de procura, alguns produtos de limpeza, documentos e fraldas. Desde que fugiu de Shujaya, dorme em um parque público.

"Não consegui dormir, pensando no que eu encontraria em casa. Mas não consegui acreditar no que vi. Não sei como vou poder voltar para cá. Mas estou vivo."

Na costa, os pescadores arriscavam a caça com rede. Saqr Bakr tinha dez peixinhos em seu balde, que lhe renderiam cerca de R$ 15 no mercado. "Amamos o mar, e a pesca é minha história", diz. Mas a atividade foi, durante o sábado, um luxo temporário permitido pela trégua.


Endereço da página: