Folha de S. Paulo


Rússia reage contra projetos espaciais dos EUA

A Rússia negará aos Estados Unidos o uso da Estação Espacial Internacional (ISS), depois de 2020, e também proibirá o uso de seus motores-foguete para o lançamento de satélites militares norte-americanos, em reação às sanções impostas pelos Estados Unidos por conta da crise na Ucrânia.

As duas medidas contra o programa espacial e o de satélites representam um dos nichos da alta tecnologia nos quais Moscou acredita ter poder de pressão sobre os Estados Unidos.

"O segmento russo da ISS pode existir independentemente do segmento norte-americano, mas o segmento norte-americano não pode existir independentemente do segmento russo", disse o primeiro-ministro assistente Dmitry Rogozin, lembrando que os Estados Unidos já não podem enviar astronautas à estação espacial de forma autônoma. A frota de ônibus espaciais dos Estados Unidos foi aposentada em 2011 como resultado de cortes nas verbas da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa).

O anúncio pode restringir a cooperação entre Rússia e Estados Unidos em áreas até agora não afetadas pelo clima político venenoso entre os dois países.

O impasse de Moscou com a Ucrânia se agravou nos últimos meses e se tornou o maior desentendimento entre a Rússia e o Ocidente desde a guerra fria, mas diplomatas dos Estados Unidos e da Rússia apontaram que as duas potências ainda assim continuavam a "fazer negócios" pragmaticamente em áreas de importância mundial.

"O espaço obviamente deixou de ser uma dessas áreas", disse um diplomata ocidental.

No mês passado, Washington decidiu revogar as licenças de exportação de bens de tecnologia que possam ser usados pela Rússia para fins militares, e recusou a concessão de novas licenças. Os norte-americanos também estão considerando novas restrições à exportação de equipamentos de alta tecnologia usados para o desenvolvimento dos recursos energéticos russos.

A ação de Moscou quanto à ISS veio na forma de rejeição a uma solicitação dos Estados Unidos de continuar usando a estação depois de 2020. A ISS, mantida coletivamente por diversos países, conta há mais de 13 anos com tripulação permanente, em rodízio constante, e é usada para pesquisas, algumas das quais são consideradas vitais para o futuro da exploração espacial.

Presumindo que a Rússia não reconsidere, sua decisão pode fortalecer a China, que planeja ter uma estação espacial em órbita em 2020 e no momento não participa da ISS - principalmente por oposição dos Estados Unidos.

Dmitry Lovetsky/AFP
Astronautas do Japão, Rússia e EUA são recebidos após pousarem hoje vindos da estação espacial
Astronautas do Japão, Rússia e EUA são recebidos após pousarem hoje vindos da estação espacial

Rogozin disse que Moscou não imporia sanções aos norte-americanos e não obstruiria o trabalho dos astronautas norte-americanos. Mas definiu os Estados Unidos como parceiro "indigno de confiança" na tecnologia, e disse que seu governo, por isso, buscaria intensificar a colaboração com outros países.

A Roscosmos, a agência espacial russa, deve apresentar em breve novos planos de exploração espacial ao Legislativo.

Rogozin disse que a agência queria redirecionar verbas da exploração espacial tripulada para outras áreas, mais promissoras, e que havia sido aconselhada a buscar cooperação com países asiáticos.

Rogozin disse que a Rússia continuaria a fornecer motores foguete MK-33 e RD-180 aos Estados Unidos, mas requereria uma garantia de que não seriam usados para o lançamento de satélites militares.

A Rússia também ameaçou desativar 11 estações terrestres do sistema GPS que operam em seu território a menos que os Estados Unidos aceitem sua solicitação para estabelecer estação semelhante de seu sistema de posicionamento por satélite Glonass em território dos Estados Unidos. As estações terrestres do GPS terão sua operação suspensa em 1º de junho e serão desativadas de vez em 1° de setembro, se um grupo de trabalho bilateral não chegar a um consenso sobre a questão do Glonass, disse Rogozin.

O GPS, do qual dependem os apps de mapas e localização, continuaria a funcionar, porque seus satélites continuariam em operação. Mas perderia precisão, porque as estações terrestres ajudam a corrigir os dados dos satélites.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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