Folha de S. Paulo


Unesco debate futuro dos Budas de Bamiyan, no Afeganistão

BAMIYAN, Afeganistão - As monumentais estátuas dos Budas de Bamiyan, no Afeganistão, eram a imagem do país intocado, mas, após 2001, passaram a ser ser símbolos do fanatismo e da intolerância do Taleban. Agora, 13 anos depois de terem sido destruídas, há um novo dilema: deixar expostas as crateras nos penhascos onde antes ficavam as estátuas, reconstruir as estátuas a partir dos pedaços que restaram ou fazer cópias delas.

Os principais países doadores que teriam que pagar por qualquer restauração dizem que o lugar deve ser deixado como está, pelo menos por enquanto.

Interessado na vitória simbólica que isso representaria sobre o Taleban, o governo afegão quer que pelo menos uma das estátuas seja reconstruída.

Mauricio Lima/The New York Times
Ao fundo, espaço onde existia um Buda esculpido na rocha até 2001, em Bamiyan, no Afeganstão
Ao fundo, espaço onde existia um buda esculpido na rocha até 2001, em Bamiyan, no Afeganstão

A discussão agita a Unesco e seus doadores, que anos atrás formaram um grupo de trabalho que vem se reunindo anualmente há uma década para analisar o que será feito com o lugar. Até agora, o grupo decidiu apenas preservar os nichos onde ficavam as estátuas e estabilizá-los para prevenir danos futuros. Os Budas e outras partes da área foram declarados Patrimônio Mundial da Unesco.

No ano passado, uma equipe alemã que fazia obras de estabilização no nicho leste começou a construir pilares para dar suporte à estrutura e proteger visitantes contra um potencial desabamento. Mas os pilares guardam semelhança notável com pés gigantes, lembrando os que conservadores indianos construíram na década de 1970 para substituir os originais, que tinham desaparecido.

Quando a Unesco descobriu o que estava acontecendo, pediu ao governo a suspensão dos trabalhos. "Nossa prioridade é estabilizar elementos icônicos que estão instáveis", disse Brendan Cassar, da Unesco. Michael Petzet, presidente do ramo alemão do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, responsável por boa parte do trabalho, explicou: "Já conversei com muitos afegãos. Eles não querem que seus filhos e netos sejam forçados pelo Taleban a ver apenas ruínas."

Monges budistas esculpiram os penhascos, achatando suas fachadas para construir uma rede de câmaras dentro deles. O maior dos Budas em pé tinha 53 metros de altura, sendo o mais alto do mundo. Mesmo o menor, com 35 metros, era monumental. Os nichos e cavernas ocupados pelas estátuas de Buda eram interligados por uma rede de túneis, escadarias e corredores abertos na rocha sólida. Boa parte dessa rede permanece intacta.

Os talebans não foram os primeiros a depredar os monumentos. O islã proíbe a idolatria, e conquistadores sucessivos voltaram sua artilharia contra o local. Mas o Taleban promoveu uma destruição sistemática das estátuas de aproximadamente 1.500 anos de idade, semeando explosivos potentes entre os nichos, em 2001, e reduzindo as estátuas remanescentes a escombros.

Michael Petzet afirma que sua equipe conseguiu preservar, identificar e catalogar até 30% da superfície do Buda menor, o que seria suficiente, segundo ele, para restaurar a estátua. Mas, de acordo com a Unesco, outros especialistas questionam essa porcentagem, que avaliam em apenas 10%. Abdul Ahad Abassi, do Ministério da Cultura afegão, disse que o governo solicitou formalmente a reconstrução do Buda menor a Unesco.

"Para mim, um dos Budas deve ser reconstruído, para atrair turistas, e um deve permanecer como está, para lembrar às pessoas o que o Taleban fez", opinou Abdullah Mahmoodi, da Associação de Turismo de Bamian. "Para proteger nossos monumentos, a melhor solução é torná-los valiosos outra vez."


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