Folha de S. Paulo


Escritores turcos pedem fim da censura ao Twitter

Orhan Pamuk, escritor turco laureado com o Prêmio Nobel, afirmou que a situação de seu país "está indo de mal a pior, e pode se tornar terrível", depois das tentativas do governo para bloquear o acesso ao Twitter, enquanto um grupo de grandes escritores, de Zadie Smith a Günter Grass, se alinhava para declarar sua "grave preocupação" sobre a "liberdade das palavras" na Turquia atual.

Os escritores, que incluem também Salman Rushdie, Margaret Atwood, Karl Ove Knausgaard, Grass e Elfried Jelinek, outra ganhadora do Nobel, assinaram uma carta conjunta da PEN International (Associação Internacional de Escritores) e da PEN da Inglaterra que define a proibição ao Twitter imposta na semana passada como "uma violação inaceitável do direito à livre expressão".

O governo turco restringiu o acesso ao site de microblogs e o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan indicou que a proibição poderia ser estendida, declarando que "não deixaria o país à mercê do YouTube e Facebook" e prometendo "tomar as medidas necessárias da maneira mais vigorosa".

Na quinta-feira, ele parecia estar concretizando essa ameaça quando a mídia turca reportou que a agência de fiscalização das comunicações do país, a TIB, havia bloqueado o YouTube como "medida administrativa cautelar".

As novas restrições surgiram horas depois que uma gravação em áudio de uma reunião de segurança entre importantes autoridades turcas vazou para o público por meio do site de vídeos. A Turquia já havia proibido o YouTube, em 2007, mas revogou a proibição três anos mais tarde.

De acordo com a PEN, a proibição ao Twitter continua em vigor a despeito de uma ordem judicial administrativa promulgada em 26 de março determinando sua suspensão até que um processo a respeito seja julgado.

Pamuk, que conquistou o Nobel em 2006, não muito tempo depois que a promotoria pública turca o acusou de "insultar a 'turquicidade'" em declarações feitas a um entrevistador, disso ao "Guardian" que "houve momentos na Turquia em que a liberdade de expressão passou por problemas igualmente graves... como em 2008, quando o YouTube estava fechado.

Mas na época ao menos tínhamos esperança quanto ao futuro. Agora não. A situação aqui está indo de mal a pior, e pode se tornar terrível".

Maureen Freely, tradutora dos trabalhos de Pamuk para o inglês e atual presidente da PEN na Inglaterra, acrescentou que "em minha opinião a preocupação real é que Erdogan agora parece ter o poder de fazer o que quer que deseje, quando quer que deseje.

E é por isso que estamos tão preocupados quanto ao que ele fará a seguir, para silenciar os dissidentes e esmagar a oposição onde quer que a veja".

Os signatários da carta apontam para o fato de que a Turquia ocupa o 154º posto entre os 180 países classificados no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa, declarando que ainda hoje "tradutores, editores, proprietários de editoras, poetas e escritores enfrentam processos criminais e até prisão por formas legítimas de expressão, sob uma variedade de grilhões administrativos".

A PEN enfatizou especialmente o caso de Muharren Erbey, advogado de direitos humanos e escritor detido em 2009 e que no momento está na prisão, aguardando julgamento.

A PEN acredita que as acusações contra o escritor tenham fundo político e que Erbey esteja preso devido à sua suposta afiliação a partidos políticos curdos. A organização defensora da liberdade de imprensa pede por sua libertação imediata.

Em sua carta, os escritores - da Turquia e de todo o mundo - apelam aos líderes turcos que "não recuem da democracia e de sua base, a liberdade de expressão, mas sim reconheçam suas obrigações sob tratados internacionais e suspendam o bloqueio ao Twitter, imediatamente".

"Instamos a eles que se recordem de que este belo país será mais forte e feliz quando, e se, apreciar o pluralismo, a diversidade e a liberdade das palavras", escreveram. "Recebemos com agrado a decisão do tribunal administrativo de Ancara de suspender a proibição [ao Twitter] até o julgamento pleno do caso, e instamos as autoridades de telecomunicações que restaurem de imediato o acesso ao Twitter".

A escritora turca Elif Shafak, que também foi julgada por "insultar a 'turquicidade'" depois da publicação de seu romance "O Bastardo de Istambul", é uma das signatárias da carta. "Os governantes da Turquia precisam compreender que a democracia não envolve apenas obter a maioria dos votos nas urnas. Muito além disso, a democracia é uma cultura de inclusão, abertura, direitos humanos e liberdade de expressão, para todos e cada um, a despeito do partido no qual tenham votado. É a compreensão do cerne real da democracia que faz dolorosa falta na Turquia de hoje", disse Shafak, cujo julgamento - baseado em diálogos dos personagens fictícios de seu romance - se arrastou por um ano antes que as acusações contra ela fossem retiradas.

A carta surge depois de um novo relatório da PEN International e da PEN da Inglaterra sobre os protestos no parque Gezi, no ano passado, e seu impacto sobre a liberdade de expressão.

"O uso expressivo da força pela polícia, bem como a censura generalizada à mídia e as represálias contra jornalistas e usuários da mídia social, ilustram severamente as deficiências da democracia turca em sua falta de pluralismo e desrespeito aos direitos e liberdades humanos", o relatório afirma, listando também "violações de direitos humanos" que aconteceram durante os protestos e apelando ao governo turco para que, entre outras coisas, garanta que a liberdade de expressão seja respeitada e que os manifestantes pacíficos não sejam "detidos arbitrariamente".

A organização também deseja que o direito de reunião pacífica seja incluído na proposta de uma nova constituição para a Turquia.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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