Folha de S. Paulo


Raro discurso de uma mulher na oração de sexta é cancelado no Irã

Um raro discurso que seria feito por uma mulher durante a oração de sexta-feira de Teerã, uma das instituições mais importantes do Irã, foi cancelado sem justificativa, frustrando defensores da igualdade de gênero.

A veterana política Massoumeh Ebtekar, 54, vice-presidente da república islâmica para temas ambientais e uma das mulheres mais conhecidas da vida pública iraniana, deveria ter falado sobre a poluição que assola as grandes cidades do país.

Seria o primeiro discurso feminino na oração oficial de sexta-feira –dia santo para os muçulmanos– desde 2010. A fala antecederia o sermão de um clérigo e a reza do meio dia.

O evento semanal é considerado uma plataforma central para debater temas sociais e políticos e costuma atrair milhares de pessoas no campus da universidade pública. Neste inverno, a reza vem acontecendo num local coberto, a imensa mesquita Mosalla, no centro da capital.

Rumores sobre o cancelamento surgiram nos últimos dias. "Talvez meu discurso na sexta-feira seja anulado", Ebtekar postou em sua página Facebook. Após a confirmação dos boatos, na noite de quinta-feira, ela voltou a se dirigir aos simpatizantes pela internet: "Não levem tão a sério... vai passar."

Embora bloqueadas no Irã, rede sociais são amplamente acessadas por meio de programas antifiltros.

ULTRACONSERVADORES

A agência de notícias Fars especula que clérigos ultraconservadores podem ter vetado a participação da vice-presidente no evento.

Facções influentes no país rejeitam a promessa de mais espaço e mais liberdade para mulheres feita pelo presidente Hasan Rowhani, eleito em junho graças a uma plataforma liberal para padrões iranianos.

Especula-se ainda que Ebtekar pode ter sido barrada por seus vínculos com o movimento reformista, banido da política local desde que liderou megaprotestos contra a reeleição supostamente fraudulenta do presidente conservador Mahmoud Ahmadinejad, em 2009.

À época, Ebtekar endossou publicamente as manifestações e acabou acusada pelos ultraconservadores de atentar contra a cúpula do regime.

Ebtekar ingressou na vida política durante o sequestro da Embaixada dos EUA em Teerã, em 1979, quando usou seu inglês perfeito para tornar-se porta-voz internacional dos estudantes religiosos que mantiveram 52 reféns americanos durante mais de um ano, num ato que levou à ruptura dos laços bilaterais.

Desde então, Ebtekar ocupou várias posições no governo, principalmente durante a Presidência do reformista Mohammad Khatami (1997-2005). Marginalizada na era Ahmadinejad, Ebtekar voltou à proeminência após aceitar convite de Rowhani para ocupar uma das 12 vice-presidências do país.


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