Folha de S. Paulo


Pleito no Irã pode levar a nova relação com o Ocidente, diz analista

A eleição inesperada do centrista Hasan Rowhani à Presidência do Irã mostra que os rumos da república islâmica não são totalmente decididos pelo líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, e que o país continua tendo intensas disputas políticas.

O diagnóstico é de Farideh Farhi, professora na Faculdade de Ciência Política da Universidade do Havaí (EUA), e uma das mais respeitadas analistas iranianas.

Em entrevista à Folha, por e-mail, ela explicou que Khamenei saiu fortalecido da eleição, mesmo que o vencedor não tenha sido seu candidato predileto.

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Folha - Como explicar a vitória de Rowhani?

Farideh Farhi - Foi uma combinação de fatores. De um lado, ele se beneficiou do suporte unificado de centristas e reformistas liderados pelos ex-presidentes Ali Akbar Hashemi Rafsanjani (1989-97) e Mohamad Khatami (1997-2005). Por outro lado, havia falta de união entre conservadores e o temor de muitas pessoas de que, se não participassem da eleição, o mais radical conservador, Said Jalili, seria eleito.

Foi uma derrota para o líder supremo?

Não necessariamente. Embora não tenha planejado essa vitória e apesar de provavelmente ter preferido um candidato conservador, ele conseguiu elevar sua posição e a de seu cargo ao ficar fora da disputa e permitir uma eleição vista pela população como limpa e transparente.

Por que os conservadores não se uniram? E por que Khameni não os pressionou a fazê-lo?

Porque eles se consideravam como principais adversários uns dos outros. Quando Rowhani surgiu como concorrente sério graças ao apoio de Rafsanjani e Khatami, já era tarde para os conservadores se unirem. Nesta eleição os conservadores agiram como um saco de gatos que ninguém, nem mesmo Khamenei, era capaz de unificar. De qualquer maneira, historicamente Khamenei tende a não interferir em brigas políticas deste tipo.

A senhora concorda com a avaliação de que a eleição de Rowhani prova que sanções ao Irã estão surtindo efeito?

Depende do que significa surtir efeito. Se o objetivo das sanções é levar centristas ao poder, então elas funcionaram. Mas, até onde sei, o objetivo das sanções é pressionar o Irã a abandonar suas aspirações nucleares, e isso não só não aconteceu como não acontecerá tão cedo, a julgar pelas palavras de Rowhani. Defensores das punições só podem reivindicar autoria [sobre a eleição de Rowhani] se se dispuserem a aliviar as medidas diante da mudança de ambiente no Irã. Mas se continuarem a ignorar este novo ambiente e insistirem em velhas exigências, que serão rejeitadas até mesmo por Rowhani, então as sanções continuarão sem funcionar.

O Ocidente pode estar otimista sobre uma possível melhora dos laços com Teerã ou até eventual acordo nuclear?

O otimismo do Ocidente depende também de suas próprias ações. A mudança de ambiente político no Irã abre caminho para uma nova forma diferente de interação. Mas se os países ocidentais não reconhecerem esta mudança e continuarem lidando com o Irã de uma maneira que não reflita esta mudança, então eles não devem ser otimistas em relação a uma resolução do dossiê nuclear e a uma melhora das relações.

O que esta eleição nos diz em relação ao modo de funcionamento da república islâmica?

O pleito nos mostrou mais uma vez que a república islâmica tem uma vida política vibrante e intensamente disputada que não é controlada por uma só pessoa, como as pessoas presumem geralmente fora do Irã.


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