Folha de S. Paulo


Iraniano vai de azarão a eleito em 4 dias

O clérigo centrista Hasan Rowhani entrou na disputa presidencial iraniana como um candidato desconhecido, sem filiação com os homens mais poderosos do regime e de chances mínimas.

Mas, no pleito ocorrido na última sexta-feira, ele recebeu mais votos que a soma de todos os cinco concorrentes, faturando uma vitória por maioria absoluta que dispensou segundo turno.

A conquista surpreendeu até voluntários da campanha, que apostavam, no melhor dos casos, num segundo turno contra os conservadores Mohamad Qalibaf, prefeito de Teerã, e Said Jalili, chefe negociador nuclear.

A quatro dias da votação, Qalibaf liderava uma pesquisa do instituto americano Ipos, com 39%. Rowhani aparecia em quarto, com 8%.

Mas a sondagem indicava que mais da metade dos iranianos estavam indecisos.

Segundo analistas, a virada foi possível graças à estratégia que visou capitalizar a insatisfação com o presidente Mahmoud Ahmadinejad.

Rowhani martelou que a inflação, o desemprego e a recessão eram causados em grande parte pelo acirramento das sanções ao programa nuclear sob os dois mandatos da era Ahmadinejad.

O clérigo, que mescla inquestionável dedicação ao Estado teocrático e vasta experiência diplomática como chefe negociador nuclear até 2005, era apresentado pela campanha como homem ideal para aliviar sanções.

Mas Rowhani também acenou para a classe média jovem e liberal que protestou contra a reeleição de Ahmadinejad, em 2009, marcada por suspeitas de fraude.

As manifestações acabaram esmagadas pelo regime, que colocou em prisão domiciliar os líderes reformistas.

Reformistas conseguiram emplacar um candidato na disputa, o ex-vice-presidente Mohamedreza Aref, mas a campanha de Rowhani pressionou por sua retirada para cerrar fileiras oposicionistas.

"Aref, te respeitamos, mas Rowhani tem que ser o escolhido", gritavam milhares de pessoas num comício de Teerã tido como divisor de águas.

"[Os conservadores] afundaram o país em sanções e se orgulham disso", afirmou Rowhani. "O resultado: 900 mil formados sem emprego."

O evento, num ginásio lotado, também consagrou dois símbolos da campanha do clérigo: a cor roxa e a imagem de uma chave para "abrir as portas do mundo".

O comício expôs o potencial de mobilização de Rowhani e eletrizou uma campanha até então apática.

APOIO DECISIVO

Rowhani arrancou apoio dos reformistas depois que Aref saiu da briga a pedido do ex-presidente Mohamad Khatami (1997-2005). Obteve ainda a bênção do ex-presidente centrista Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, cuja candidatura havia sido barrada.

"Sem Khatami e Rafsanjani, a vitória teria sido impossível", admite um assessor de Rowhani. A oposição também foi favorecida pela divisão dos conservadores, que se recusaram a unir forças.

Hamed Nematollahi, editor do site Mehr, minimiza o racha e diz que Qalibaf cometeu erro estratégico ao optar por um discurso semelhante ao do campo moderado.

"Jalili era melhor [para os conservadores], mas ele foi demonizado por defender resistir [à pressão ocidental]. Seus rivais disseram que ele traria guerra e mais crise."


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