Folha de S. Paulo


Delator de espionagem dos EUA diz que quer ser julgado em Hong Kong

O técnico em informática Edward Snowden, delator dos programas de monitoramento dos serviços de inteligência dos Estados Unidos, negou que queira fugir e disse que quer ser processado pela Justiça de Hong Kong, na que afirma confiar.

Ele viajou para a cidade no fim de maio, à espera da revelação dos esquemas de monitoramento de dados telefônicos dos americanos e informações de usuários de internet de todo o mundo, feito pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos.

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A primeira declaração do informante após ter sido revelado no domingo pelo jornal britânico "Guardian" foi publicada nesta quarta-feira pelo jornal "South China Morning Post".

Na entrevista, Snowden disse não ter dúvidas sobre sua escolha por Hong Kong e disse não ser "nem herói, nem vilão" em relação ao monitoramento.

"As pessoas que pensam que cometi um erro não entenderam as minhas intenções. Eu não estou aqui para me esconder da Justiça, estou aqui para revelar a criminalidade", disse.

"Minha intenção é pedir que os tribunais e a população de Hong Kong decidam meu destino. Acho razoável ser processado, desde que eu tenha garantido o direito de um julgamento e de apelação".

A decisão do técnico foi questionada por advogados de direito internacional e ativistas de direitos humanos, que consideram que ele não está seguro em Hong Kong. O diretor de emergências da Human Rights Watch, Peter Bouckaert, acredita que as autoridades locais devem ajudar os Estados Unidos.

"Tenho poucas razões para acreditar que as autoridades de Hong Kong não cooperariam com a CIA (Agência Central de Inteligência, em inglês)", disse, fazendo referência à cooperação entre o território chinês e Washington no caso do asilo a um opositor líbio.

EUA e Hong Kong têm um tratado de extradição, pelo qual se comprometem a trocar fugitivos de crimes comuns, mas podem recusar casos políticos. O texto prevê possibilidade de veto da China.

Advogados consultados divergem sobre que acusações o governo pode apresentar contra ele, que podem ir desde espionagem até colaboração com o inimigo e abertura de informações de defesa a governo estrangeiro.

CONFIANÇA

Durante a entrevista, o agente diz que confia na Justiça de Hong Kong, que tem a tradição de acolher vítimas de perseguição política, e revelou seu destino de ficar "até que seja convidado a se retirar".

"Tive várias oportunidades de sair daqui, mas vou ficar e lutar contra o governo americano nos tribunais, porque tenho confiança na Justiça".

Edward Snowden ainda não foi acusado por nenhum crime. Na segunda (10), a Casa Branca informou que ele seria processado pelo Departamento de Justiça americano, mas não disse se ele seria extraditado. No mesmo dia, o ex-técnico da CIA saiu do hotel onde estava hospedado em Hong Kong.

O "South China Morning Post" não informou sobre a localização do delator. O jornalista do "Guardian" Ewen MacAskill, um dos que entrevistou o técnico, disse que ele está em uma casa em Hong Kong, mas sem dar detalhes.

Ex-assistente técnico da CIA e funcionário da Booz Allen Hamilton, prestadora de serviços no setor de defesa, Snowden trabalhava para a NSA (Agência Nacional de Segurança) há quatro anos, como representante da Booz Allen e de outras empresas, como a Dell.

A NSA, cujo material foi divulgado por Snowden, é uma das organizações mais sigilosas do mundo. De acordo com as informações apresentadas pelo delator, a agência monitorou os registros de ligações de milhões de telefones da Verizon, segunda maior companhia telefônica dos EUA.

Também foram verificados dados de usuários de internet de todo o mundo em empresas de internet como Google, Facebook, Microsoft e Apple. O escândalo causou críticas ao presidente Barack Obama, que combateu a espionagem feita pelas agências quando fazia oposição ao republicano George W. Bush.


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