Folha de S. Paulo


Senador boliviano exilado em embaixada vai ao STF

Prestes a completar um ano asilado na embaixada brasileira em La Paz, o senador boliviano Roger Pinto Molina pediu ao STF que obrigue o Itamaraty a resolver sua situação.

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O advogado dele no Brasil, Fernando Tibúrcio, protocolou na última sexta-feira um habeas corpus extraterritorial --classificado no documento como o primeiro caso na Justiça do país.

A parte contrária é a presidente Dilma Rousseff, por ter, segundo o advogado, a competência de manter relações com Estados estrangeiros.

O senador de 53 anos, um dos líderes da oposição ao governo Evo Morales, diz ser alvo de perseguição após denunciar autoridades de seu país por suposto envolvimento com o narcotráfico.

Ele recebeu asilo brasileiro em junho do ano passado, 11 dias depois de pedir, de surpresa, um encontro com o embaixador Marcel Biato.

A Bolívia negou o salvo-conduto para que ele deixe o país, sob a justificativa de que o senador responde a uma série de processos judiciais.

Para Tibúrcio, o governo brasileiro age com "inércia". "O Itamaraty vem levando um verdadeiro drible da chancelaria boliviana", escreveu.

O Ministério das Relações Exteriores, por meio de assessoria de imprensa, disse que não se manifestaria sobre o caso, para não atrapalhar as negociações bilaterais.

Editoria de Arte/Folhapress

PRAZO

O habeas corpus pede um prazo de até seis meses para o governo federal resolver a situação, procurando a OEA (Organização dos Estados Americanos) ou fazendo valer pactos internacionais.

Outra possibilidade é que o STF determine a concessão de um carro diplomático para Pinto deixar o país --solução que poderia ter amparo na Convenção de Viena, que garante a inviolabilidade das representações estrangeiras.

Mas não há consenso no direito internacional se um carro goza dos mesmos direitos de uma embaixada.

Os governos dos dois países anunciaram, em março, uma comissão para resolver a questão. Houve duas reuniões: no dia 1º de abril, em São Paulo, e no início do mês, em Cochabamba. O Itamaraty não informou o que foi discutido nem quem participou.

VIDA RECLUSA

Gaston Brito 16.abr.2010/Reuters
O senador de oposição Roger Pinto, em foto de 2010, que pediu asilo político na embaixada brasileira de La Paz
O senador de oposição Roger Pinto, em foto de 2010, que pediu asilo político na embaixada brasileira de La Paz

Pinto vive em um espaço de cerca de 20 m² no primeiro andar da embaixada, longe de funcionários do local.

Só entram no cômodo pessoas autorizadas. Até março, havia uma certa flexibilidade: ele recebia colegas da oposição, amigos e pastores.

Desde então, o Itamaraty limitou o acesso exclusivamente a um advogado, um assistente e familiares.

Os parentes, na verdade, se restringem à filha caçula, Denise, 23, e a uma prima do senador. A mulher, outra filha, dois netos e a sogra se mudaram para o Acre na época em que Pinto entrou na embaixada, dizendo ter medo de ameaças.

Estão em Brasileia (AC), separada por uma ponte da boliviana Cobija.

Em 2012, quando Pinto completava cem dias asilado, Denise disse à Folha que a família esperava estar reunida novamente para o Natal.

Passaram-se outras festividades, sem nenhuma resposta. O aniversário de Pinto, em 23 de abril, foi comemorado ao lado da filha e de um computador com Skype, meio para uma reunião a distância.

O senador também tem acesso a tablet e a uma televisão. Quando está sozinho, lê livros e faz exercícios em uma bicicleta ergométrica.

Sem poder tomar sol, toma medicamentos para repor vitaminas. O ar livre é visto por uma grande janela, com vista para uma praça no centro de La Paz, em uma das principais avenidas da cidade.

Três refeições diárias são servidas pela embaixada. O banheiro foi "emprestado" dos fuzileiros navais que fazem a segurança do prédio.

O Itamaraty informou, pela Lei de Acesso à Informação, que a estadia só custou ao país US$ 463 (cerca de R$ 925), para reparos na sala que Pinto ocupa.

Disse ainda que os móveis da sala foram doados por amigos e familiares e que gastos "com energia e água são pouco significativos".


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