Folha de S. Paulo


Berço da Primavera Árabe, pequena cidade da Tunísia vê pouco progresso

A pequena Sidi Bouzid é o berço da Primavera Árabe. Localizada no centro rural do país, a cidade, de quase 40 mil habitantes, não tem um prédio com mais de três andares, é cercada por plantações de oliveiras, terra plana e seca. Aqui Mohamed Bouazizi se imolou, em 17 de dezembro de 2010. Vendedor ambulante de frutas, 26, ele ateou fogo ao próprio corpo, após ser espancado e ter sua carroça confiscada pela polícia.

Milhares saíram às ruas da cidade protestando em solidariedade e, em semanas, os protestos se espalharam pelo país.

Hoje, dois anos depois, Sidi Bouzid segue em compasso de espera, como promessa de cidade do futuro da Tunísia. Ganhou um monumento em homenagem a Mohamed Bouazizi. Ficou famosa no mundo todo, foi parar na Wikipedia, ganhou milhões de cliques no Google e só. É visitada pontualmente por jornalistas, pesquisadores e curiosos estrangeiros.

No segundo aniversário do início da revolução em dezembro último, o presidente da Tunísia, Moncef Marzuki, foi atacado a pedradas quando discursava num ato solene em Sidi Bouzid.

"Há muitas promessas de projetos de ONGs internacionais, da União Europeia, do governo. Mas ainda não vimos nenhuma melhoria real ou mudança na situação da cidade", afirmou Hichem Daly, presidente da associação Karama. Fundada após a revolução, a ONG local promove o desenvolvimento da região e o empreendimento entre jovens.

O governador da cidade, porém, lista a construção de quatro escolas, investimentos de 2 milhões de dinares tunisianos (cerca de R$ 2,63 milhões) para eletricidade em áreas rurais e de 150 milhões de dinares (R$ 197 milhões) na melhoria de estradas. Tudo ainda no papel.

"O desenvolvimento de um projeto leva em média cinco anos, não é algo que acontece em um ano", afirma Amara Tlijani. Formado em Economia, ele tomou posse em outubro do ano passado depois que o governador anterior foi acusado de corrupção pela população e deposto após uma onda de protestos.

Na prática, os projetos que serão financiados pelo governo e pela iniciativa privada estão emperrados em meio à burocracia e ao novo jogo político democrático. A situação política instável no país também deixa os investidores estrangeiros cautelosos. O que se traduz em redução e bloqueios de recursos. O ciclo se repete no âmbito nacional.

"Os grupos da sociedade civil da cidade não tem experiência ou maturidade política para liderar muitos dos projetos", afirmou Tlijani.

Os ativistas rebatem pedindo mais transparência do governo e medidas eficazes contra a pobreza.

"Uma dos principais causas da revolução foi justamente a pobreza. A maioria da riqueza do país está concentrada na costa. A revolução só teve sucesso porque a região toda vivia a mesma situação. Mas nada mudou aqui ainda e a frustração é grande, principalmente entre os jovens", disse Ramzi Abdauli, 22, ativista de direitos humanos e morador da cidade.


Endereço da página: