Folha de S. Paulo


Reforma de Trump pode tirar investimento do Brasil

A redução da alíquota de impostos de empresas americanas de 35% para 20% prevista no projeto de reforma tributária americana, aprovada pelo Senado dos EUA, causa apreensão no Brasil.

A preocupação de especialistas é que a medida poderia tornar mais atrativo para as múltis americanas declararem o lucro nos EUA, deslocando investimentos para aquele país.

Por outro lado, a percepção é que esse tipo de decisão implicaria, em última instância, diminuir as operações no Brasil, o que, dado o tamanho e a importância do mercado consumidor, está longe de ser considerado trivial.

As ponderações feitas por especialistas mostram que as discussões sobre os efeitos das mudanças de tributação delineadas pelo governo de Donald Trump estão apenas começando, mas prometem.

As empresas, dizem consultores e advogados, já se movimentam para entender os efeitos da reforma costurada por Senado e Câmara nos EUA, que ambicionam votar versão única até o Natal.

"As alterações objetivam atrair investimentos para os EUA e estimulam que lucros gerados pelas empresas americanas mundo afora passem a ser mais lá declarados e apurados, em prejuízo do resto do mundo, inclusive do Brasil", diz José Roberto Afonso, professor do IDP e pesquisador do Ibre da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Ele lembra que a proposta discute também outros pontos, como a dedução de 100% dos dividendos obtidos pela subsidiária americana que optar por reenviá-los para os EUA – o que não ocorria. "Pode causar ao Brasil perda de arrecadação, de investimentos, produção e emprego".

Para Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute, em Washington, a decisão de uma empresa de declarar lucros obtidos no Brasil nos EUA faria sentido, mas em um contexto de redução de investimentos no Brasil.

Como a decisão de se estabelecer no Brasil já é muito custosa para uma companhia americana, diz Bolle, entram nessa conta outros fatores além do imposto.

"Acho que a determinação de reduzir investimentos no Brasil não viria pela simples redução de alíquotas, mas de uma decisão estratégica mais abrangente", diz Bolle.

A economista ressalta ainda que as empresas americanas que estão no país exploram o mercado local, o que, para ser mais vantajoso, implica estar no Brasil.

Para ela, a reforma deve ser mais sentida por países que hoje são usados como plataforma de exportação de empresas americanas.

São países como o México que podem se tornar menos atraentes com a menor tributação, o que está fazendo os mexicanos começaram a se mexer, conta ela.

O Brasil, com uma economia mais fechada, seria menos afetado. "Perversamente, está aí um exemplo da nossa controversa política protecionista nos favorecendo."

Francisco Cortez Neto, advogado especialista em transações internacionais, concorda que as mudanças tributárias mais amplas podem tornar mais atrativa a declaração de lucro nos EUA, mas pondera que outros fatores contam no momento de uma empresa tomar uma decisão desse porte.

"Por mais que o ambiente americano se torne favorável, as empresas não decidem mudar sua sede de um país para outro da noite para o dia", diz. "É prematuro dizer os benefícios que terão com as mudanças."


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