Folha de S. Paulo


Análise

Aos poucos, streaming absorve cipoal de tributos

O cofundador e presidente da Netflix, o americano Reed Hastings, costuma brincar, quando questionado por jornalistas sobre pagar imposto no Brasil: "Qual? São tantos".

Os repórteres brasileiros riem, ele também, reafirmando por fim, sério, que a Netflix paga "todos os impostos" devidos desde que chegou ao país, seis anos atrás, seu primeiro mercado internacional.

No fim de 2016, foi sancionada a chamada reforma do ISS (Imposto Sobre Serviços), que permitiu agora que São Paulo e Rio –este já há um mês– passem a cobrar da Netflix e de serviços semelhantes, como o Spotify.

O prefeito João Doria gravou mensagem supostamente agressiva, dizendo que "aqui em São Paulo não tem conversa, vai pagar imposto, sim". Simulou uma ordem: "E não deve aumentar o valor do serviço prestado à população. Tira da sua margem. Não venham querer ganhar em cima do consumidor".

Na verdade, Hastings, já em março, havia afirmado à Folha: "Vamos pagar [o ISS]. Não será repassado aos nossos clientes. Não haverá aumento na mensalidade".

Deixando de lado a bravata do prefeito, a absorção sem resistência do ISS por Netflix, Spotify e outros é novo sinal da crescente normalização das operações de streaming.

Eles vão aos poucos se enquadrando na regulação do país –o que é até urgente, no caso da Netflix, já com mais assinantes do que a maior operadora de TV paga, segundo uma avaliação da própria Ancine, agência que regula todo o setor audiovisual.

O próximo passo na normalização, talvez o maior, será dado na próxima quarta (22), quando outra taxa, a Condecine, deve ser encaminhada pelo governo federal.

As alíquotas de ISS, 2% no Rio e 2,9% em São Paulo, foram facilmente assimiladas, mas a nova contribuição pode ter impacto maior. A questão é que a Condecine (originalmente voltada ao cinema, recaindo depois sobre todo o audiovisual) para o vídeo por demanda está inteiramente em aberto, com várias propostas, desde adaptar a regulação vigente até avançar sobre YouTube e Facebook.

A maior divergência entre os atores do setor, em número crescente, estrangeiros e nacionais, inclusive o Grupo Globo, se dá entre cobrar a contribuição por títulos exibidos ou por faturamento.

Outra questão recente na mesa é destinar ou não, previamente, parte da arrecadação para coproduções nacionais. A decisão sobre tudo isso é esperada para quarta (22).

As conversas vêm sendo centralizadas pelo ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, que, para tanto, foi há duas semanas até a sede da Netflix, em Los Gatos, na Califórnia.

O propósito é oferecer às empresas maior segurança regulatória, o que levaria a mais investimentos. As definições recentes do ISS também seguem nessa direção.

Ao que parece, está dando certo. Nesta sexta (17), a HBO prometeu para "muito em breve uma nova maneira de oferecer HBO Go ao mercado brasileiro". Hoje o seu serviço de streaming é apenas para assinantes de TV paga. A "nova maneira", há muito aguardada, é assinar só pela internet –como a Netflix.


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