Folha de S. Paulo


Campanha 'com história' ganha peso entre as pequenas empresas

Antes limitado às estratégias de marketing das grandes corporações, o "storytelling", ou a capacidade de contar histórias nas peças de publicidade, começa a ter destaque também em empresas de menor porte.

A tática é útil porque, ao ouvir um argumento, a maioria das pessoas se lembram com mais facilidade de uma boa história do que gráficos ou estatísticas, por exemplo, segundo o consultor Ricardo Fonseca, sócio da consultoria especializada 4Humagers.

"Há estudos que indicam que 60% das pessoas se lembram da narrativa e apenas 5%, de recursos visuais, como diagramas, após uma apresentação", diz Fonseca.

Karime Xavier/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 12.04.16 09h Na UBS Boracea criancas tomam vacina contra gripe H1N1. Rua Boracea, 270, Barra Funda, São Paulo, SP. Ana Júlia Barbarulo (4).(Foto: Marcus Leoni / Folhapress, FOLHINHA) ****EXCLUSIVO FOLHA****
Luiza Pannuzio conta histórias das suas criações e dos clientes por meio de redes sociais

Um caso conhecido de "storytelling" é o da Sucos do Bem, que abriu as portas em 2009 como microempresa e foi vendida para a Ambev em 2016.

Desde o início, a tática foi ganhar proximidade com o cliente e afeiçoá-lo à marca.

Para isso, a empresa conta na embalagem que as laranjas vêm de pequenas fazendas, como a do "seu Francisco".

A aposta é a de que, ao saber de onde vem a matéria-prima, o consumidor passe a acreditar que há uma preocupação em informá-lo e adotar práticas mais artesanais.

Mas não é preciso explicar a origem da empresa nem sua cadeia de produção para contar uma boa história, segundo João Ricardo da Matta, professor de comportamento do consumidor no MBA em marketing da FGV (Fundação Getulio Vargas).

A empresária Luiza Pannunzio, 38, dona do Atelier Pannunzio, loja de roupas em pequena escala, criou uma rede de contatos entre as clientes, nas redes sociais, onde cultiva essa relação emocional delas com a marca.

A ideia é que as consumidoras participem das conversas e enviem fotos e vídeos com as criações de Pannunzio. "A empresa precisa desse lado humano. Qualquer um pode vender roupas, mas eu vendo um pouco da Luiza e mostro essa 'alma'", afirma.

Para os pequenos empreendedores, que não podem investir grandes cifras em comunicação, a sugestão é avaliar com cuidado o que realmente diferencia a empresa em relação aos concorrentes e criar ações com base nesses "trunfos", sugere Matta.

"Assim, é possível usar as histórias para criar admiração pela marca", diz.

Para Thiago Costa, coordenador da pós-graduação em comunicação e marketing digital da Faap, a tática ganhou espaço porque a compra é pautada pela relação emocional do cliente com o produto ou a marca.

"Mas a maioria justifica essas aquisições com a razão, por isso o 'storytelling' se tornou relevante", diz.

CUIDADOS

É importante ter uma narrativa por trás da marca, mas vale ter cuidado para não ir longe demais e inventar histórias.

A Sucos do Bem teve que responder em 2014 a uma representação no Conar (Conselho de Autorregulamentação Publicitária) de uma cliente que duvidava da veracidade da origem da laranja usada por eles.

Isso porque, na embalagem, constava a informação de que as frutas vinham "da fazenda do senhor Francisco, esconderijo tão secreto que nem o Capitão Nascimento poderia descobrir".

Na defesa, a empresa argumentou que as frutas têm origem em diversas fazendas de menor porte e a queixa acabou arquivada.

"Depois, fizemos mais de 40 embalagens mostrando as histórias que cercam a produção de nossos sucos", diz Marcos Leta, 35, fundador da empresa.

Se a publicidade não for verdadeira, o Conar pode recomendar a alteração ou a suspensão da campanha.

Mas são poucos os casos em que houve violação clara, segundo Gilberto Leifert, presidente do Conar.

"É preciso contar uma história verdadeira, ainda que tenha alguma criatividade", diz Leifert.

A Diletto, de sorvetes, mudou a propaganda após processo semelhante em 2014. Para o Conar, a história dos produtos, receitas do "Nonno Vittorio", seria uma fantasia. Foi eliminada das campanhas.

Procurada, a empresa não retornou o contato até o fechamento desta reportagem.


Endereço da página: