Folha de S. Paulo


França reduz imposto dos mais ricos para resgatar contribuinte

Os franceses costumam chamar as reduções de impostos de "presente fiscal". O termo é mais utilizado quando o corte beneficia o bolso dos mais ricos e voltou às manchetes no mês passado.

Ao apresentar o projeto de orçamento do Estado para 2018, o ministro da Economia francês, Bruno Le Maire, anunciou um desses "presentes" para quem ocupa o topo da pirâmide social francesa, o famoso 1% mais rico.

A nova medida da presidência de Emmanuel Macron é a "flat tax", que se aprovada pelo Parlamento, reforma o imposto que incide sobre aplicações financeiras. A taxa passaria de progressiva a uma alíquota única de 30% sobre ganhos de capital —atualmente a taxa pode chegar a 60%. A medida vai privilegiar principalmente os maiores investidores. Ou seja, o 1% mais rico.

Mas quem é esse 1% mais rico na França? Em relação à renda anual, um pessoa precisa ganhar acima de €161,4 mil (cerca de 607 mil reais) para fazer parte do topo da pirâmide francesa. Esse grupo, de cerca de 300 mil contribuintes, detém 10,4% da renda total distribuída no país, segundo um estudo recente do World Wealth and Income Database, capitaneado pelo economista francês Thomas Piketty.

Os que ganham mais na França também são os que mais impostos em valores totais. A partir de €152 mil por ano, a mordida do leão francês é de 45% só de imposto de renda. Isso sim, o dinheiro é redistribuído à sociedade através de ajudas sociais e serviços públicos de qualidade, que não são necessariamente são utilizados pelo 1%, mas isso é considerado justo em um país onde "igualdade" faz parte do lema nacional.

Nas urnas, o 1% vota historicamente em partidos da direita conservadora, que controlam todos bairros nobres de Paris, assim como as cidades limítrofes no oeste da capital, onde se concentram as famílias ricas do país.

Chamada de o "gueto dos ricos", essas cidades formam o departamento de Hauts-de-Seine, um dos mais ricos da França. O expoente da região é Neuilly-sur-Seine, a cidade dos milionários.

No último dia 21, a cidade perdeu Liliane Bettencourt, uma de suas moradoras mais conhecidas e, certamente, a mais rica. Herdeira do império L'Oréal, Liliane era a mulher mais rica do mundo, com uma fortuna estimada em €35,8 bi.

Na França, Bettencourt ocupava a segunda posição no ranking geral, depois de perder o topo do pódio para Bernard Arnault (68), magnata dono da LVMH, o maior conglomerado de luxo do mundo. Calcula-se que sua fortuna tenha atingido os €47 bi, em 2017.

Pessoas como Arnault, os chamados "ultra-ricos, não utilizam transporte público, mandam seus filhos para escolas particulares na França ou no exterior, passam férias de verão em iates na Côte d'Azur e, no inverno, esquiam na Suíça. Diferentemente, do Brasil, são discretos.

Suas fortunas costumam ser familiares, assim como o controle acionário de suas empresas e conglomerados —no ranking das dez maiores fortunas da França publicado este ano pela revista Challenges, nove são familiares.

Abaixo desses "ultra-ricos" está a alta burguesia do país. Andam em carros de luxo, mas sem blindagem nem seguranças. Podem ser herdeiros, executivos de grandes empresas, engenheiros ou médicos. Compram em lojas de luxo e enchem páginas de revistas de celebridades, como a "Paris Match".

Além de frequentar restaurantes estrelados pelo Guia Michelin, o 1% mais rico na França é membro de clubes exclusivos, como o Union Interalliée, criado em 1917 quando os EUA entraram na Primeira Guerra Mundial. Fica bem perto do Palácio do Eliseu, sede da presidência francesa. Macron, aliás, faz parte do 1% e trabalhou durante anos para banqueiros. Não à toa, vem sendo taxado de "presidente dos ricos".


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