Folha de S. Paulo


Nem todo mundo via graça no mundo de criador da Playboy

"Nós gostamos de fazer drinques e um aperitivo ou dois, botar na vitrola uma música relaxante, e convidar uma mulher para uma discussão silenciosa sobre Picasso, Nietzsche, jazz e sexo." Assim Hugh Hefner definiu a filosofia da "Playboy" no editorial que assinou na primeira edição da revista, em 1953.

O "timing" de Hefner não poderia ter sido melhor. No início dos anos 1950, os Estados Unidos começavam a viver um período mais liberal.

O crescimento econômico do país após a Segunda Guerra criou uma geração de jovens com dinheiro e pretensões à sofisticação. A filosofia hedonista e um tanto machista da "Playboy" capturou perfeitamente o espírito da época, em que o sexo deixava de ser um tabu tão grande. Que homem dos anos 1950 não gostaria de ser Hugh Hefner?

O Playboy Original
Hugh Hefner morre aos 91 anos

Nas décadas seguintes, a popularidade da revista só aumentou. O segredo de Hefner foi vender sexo, mas embalado de forma "sofisticada".

A revista trazia, além de mulheres estonteantes, textos jornalísticos e de ficção de pesos-pesados da imprensa e literatura, como Norman Mailer, Jack Kerouac, Margaret Atwood, Joyce Carol Oates e Gabriel Garcia Márquez.

A "entrevista da 'Playboy'" tornou-se uma marca importante da revista, oferecendo revelações de políticos (Jimmy Carter, Fidel Castro), autores (Tennessee Williams, Vladimir Nabokov, Gore Vidal) e artistas (Woody Allen, Frank Sinatra, Barbra Streisand, John Lennon e Yoko Ono são alguns dos exemplos).

No início dos anos 1960 —quando o democrata John Kennedy surgia como a opção mais sexy e liberal a republicanos da Velha Guarda como Eisenhower e Nixon—, a "Playboy" era "a" revista do momento. A circulação atingiu o ápice nos Estados Unidos no início dos anos 1970, quando chegou a 7 milhões de exemplares (a maior vendagem foi da edição de novembro de 1972, com a modelo Pam Rawlings na capa, que vendeu quase 7,2 milhões de exemplares).

Mas nem todo mundo via graça no mundo de Hefner: além de alvo de movimentos conservadores e religiosos, a revista foi atacada por feministas e tachada de misógina.

Em 1963, a escritora Gloria Steinem usou um nome falso, conseguiu um emprego de "coelhinha" num dos "Playboy Clubs" (boates temáticas da "Playboy") e contou a experiência no artigo "A Bunny's Tale" ("A história de uma coelhinha").

Ela narrou as humilhações e o assédio que sofreu e expôs o que considerava a hipocrisia de Hefner, que vendia a "Playboy" como um baluarte da liberdade sexual, mas que restringia essa liberdade, segundo Steinem, aos homens.

Com o passar dos anos, a imagem de Hugh Hefner, "o bon vivant de robe e cachimbo na mão", se tornou uma relíquia de outra era. A revista sofreu com a concorrência de rivais, e a internet e a pornografia virtual acabaram com o charme de abrir o plástico da revista para descobrir os mistérios das mulheres mais desejadas do planeta.


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