Folha de S. Paulo


Cavalo crioulo cai nas graças de investidor e movimenta R$ 100 mi

Quase cinco séculos após a chegada ao Brasil, trazido por portugueses e espanhóis, o cavalo crioulo se tornou um dos negócios mais lucrativos de uma das maiores feiras de agronegócio da América Latina, a Expointer, realizada anualmente em Esteio (RS).

Neste ano, a raça representou cerca de 80% das vendas da parte de animais da feira, com cerca de R$ 8 milhões.

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O valor é apenas uma parcela da economia do setor. Segundo a ABCCC (Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulo), o comércio da raça gira em torno de R$ 100 milhões por ano, apenas com negócios fechados em leilões. Isso exclui vendas particulares e de coberturas, quando é negociado o sêmen do cavalo, dos quais a associação não tem controle.

"O mercado foi muito movimentado em 2016, e a gente acha que neste ano vamos chegar perto desse patamar também. Mesmo com toda a crise", disse o presidente da associação, Eduardo Suñe.

Basta assistir a um leilão de cavalos da raça para perceber que a palavra "crise" mal chegou ali. O público acompanha ao vivo, na TV e na internet, e os leiloeiros repercutem os lances que chegam via mensagem de celular e telefonemas, de investidores que estão na China, na França, em Goiânia ou no interior do Rio Grande do Sul.

Um dos leiloeiros mais tradicionais a trabalhar com a venda de cavalos crioulo, Marcelo Silva, da empresa Trajano Silva, começou a negociar a raça em 1981. O salto, diz, ocorreu em 2000, quando os leilões chegaram à TV.

O crioulo era então mais uma das raças que desfilavam nas pistas, entre árabes, manga-largas e quartos-de-milha. Aos poucos, foi virando a principal e hoje emprega 240 mil pessoas em todo o país.

"Basicamente porque tivemos criadores de outras origens, que não da agropecuária pura e simples. Banqueiros, advogados, médicos e industriais começaram a comprar", disse Silva.

O investimento nesse mercado chega a dar retorno de 25% ao ano, afirma.

Além disso, os leilões permitem pagar o animal em até 50 parcelas. "Tem gente que acha que é muito tempo, quatro anos, mas foi o que fez com que um mestre de obras pudesse comprometer R$ 100 por mês e comprar seu cavalo. Nenhuma outra raça tem essa condição."

VERSÁTIL

A versatilidade garantiu ao crioulo o mercado de maior capilaridade no país, mesmo não sendo a raça mais cara ou de maior prestígio.

Ao contrário dos puro-sangue-inglês, o crioulo não precisa de baias sofisticadas ou alta manutenção. É um cavalo rústico, que se cria a pasto e água, em ambiente natural, sem delicadeza.

"O preço varia de R$ 5.000 a R$ 7 milhões. É a única raça que tem essa variação", afirmou Suñe.

O que agrega valor a um animal é a genética. Quanto mais filhos campeões um cavalo for capaz de produzir, mais aumentam sua pontuação na associação e o valor de mercado. O problema é que não é uma ciência certa, mas sorte.

"Você faz uma aposta. Acredita na genética, faz uma análise morfológica, mas, para provar que é um bom pai, os filhos dele têm que provar na pista. A valorização da raça crioula é baseada no julgamento", disse Lauro Martins, administrador da Cabanha Maior, de Painel (SC), proprietária de JLS Hermoso.

Há dois anos, o cavalo de 17 anos, nascido em uma cabanha do interior gaúcho, filho de duas das melhores linhagens, se tornou o mais caro da história da raça -R$ 16,5 milhões- quando seus donos colocaram cotas de cobertura à venda.

Investidores pagaram entre R$ 400 mil e R$ 600 mil para ter o direito de usar cinco coberturas do garanhão, em um ano. Ao todo, foram vendidas 15 cotas.

Enquanto o Brasil começa a se recuperar da recessão, o mercado do cavalo crioulo, que mantém média de crescimento de 4,35% desde 2015, é otimista. "Não tem nenhuma outra raça tão versátil. Da vaquejada a andar no Pantanal, cavalo crioulo. Os outros vão tendo uma ou outra restrição", disse Silva.


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