Folha de S. Paulo


Crise na construção civil deixa indústria fora da recuperação

A recuperação da economia no segundo trimestre alcançou o consumo e os serviços, mas ainda deixou de fora o setor industrial.

O consumo cresceu 1,4%, e os serviços, o outro lado da melhora de renda da população, subiram 0,6%.

Mas, contaminado pelo desempenho bastante negativo da construção civil, o setor industrial recuou 0,5% no trimestre, ante os primeiros três meses do ano. Na comparação com o mesmo período de 2016, a queda foi de 2,1%.

PIB DO BRASIL
Economia do país cresce 0,2% no 2º tri

A construção recuou 2% no segundo trimestre, em relação ao primeiro trimestre –sexto tombo consecutivo.

O setor está sendo afetado pelo menor número de obras públicas, em meio a um ajuste nas contas do governo, e pelo impacto da Operação Lava Jato sobre as construtoras.

Também sente o efeito da lentidão nas vendas no setor imobiliário, envolto em aumento dos distratos de consumidores que decidiram devolver os imóveis.

PIB - Trimestre X trimestre imediatamente anterior, em %

O desempenho pesou sobre a indústria, ainda que o segmento de transformação tenha ficado estável (+0,1%) e o setor extrativo mineral tenha subido 0,4% no trimestre. Ambos estão escorados na produção voltada para o mercado externo.

Sozinho, o consumo responde por 65% do PIB, mas o sinal positivo ainda fraco nos demais setores coloca dúvidas sobre a disseminação da retomada econômica.

A agropecuária ficou no zero no segundo trimestre, efeito já esperado após a expansão forte no início do ano. Nos próximos meses, os efeitos da safra recorde de grãos vão se dissipar e não ajudarão mais a empurrar o PIB.

Os investimentos em queda (-0,7%) indicam que os empresários adiaram, mais uma vez, planos de elevar a capacidade de produção.

Porém, mais que o recuo em si, analistas observam que o resultado indicou reversão na tendência de quedas cada vez menores que se manteve por seis trimestres seguidos.

Na comparação com o segundo trimestre do ano passado, o investimento recuou 6,5%. Nos três primeiros meses, a queda fora de 3,5%.

Para o economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio) Fábio Bentes, o consumo deve melhorar à medida que o desemprego recuar. Taxas de juros menores e a liberação de novos empréstimos devem dar impulso às vendas do comércio.

As vendas do varejo subiram no segundo trimestre, com destaque para os setores de material de construção, vestuário e eletrodomésticos.

Bentes afirma, contudo, que o investimento é necessário para dar sustentação à retomada da economia.

"O consumo é o esqueleto da economia, mas o que faz o corpo caminhar é a musculatura dos investimentos."

PIB por setores

CORTINA DE FUMAÇA

Para José Marcio Camargo, sócio da Opus Investimentos, os investimentos deverão mostrar números positivos ainda no fim do ano, na esteira do consumo. "A volta do crescimento se dará pelo consumo, e não pelos investimentos, com os juros caindo e a inflação despencando."

Segundo ele, a recuperação da economia após três anos de recessão já estava ocorrendo. "As incertezas políticas criaram uma 'cortina de fumaça', e os economistas não estavam vendo que a recuperação acontecendo."

O cenário otimista, descrito por boa parte dos analistas do mercado, depende, além da manutenção do consumo, da diminuição da crise no campo político.

Para o Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção), a indicação de cortes adicionais no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) em 2018 aponta para uma perspectiva negativa para o setor. "A construção vive seu pior período em décadas. E, a julgar pela queda nos investimentos, não há expectativa de melhora no curto prazo", diz a entidade em nota.


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