O novo ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, deixou clara já na posse, em julho, a sua prioridade: desenvolver a economia criativa.
Aqui, ele conta como pretende enfrentar esse desafio com os poucos recursos da pasta, que conta nesta ano com R$ 2,7 bilhões. Uma saída, diz, é mudar a lei Roaunet, de renúncia fiscal, para introduzir financiamento por fundos patrimoniais e crowdfunding.
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Pedro Ladeira/Folhapress | ||
O ministro Sérgio Sá Leitão, em Brasília |
RAIO-X
Formação
Graduação em jornalismo pela UFRJ e pós-graduação em políticas públicas pela USP e em E-business pelo Ibmec (atual Insper)
Carreira pública
Foi chefe de gabinete de Gilberto Gil no Ministério da Cultura, diretor da Ancine e secretário da Cultura do Rio, na gestão de Eduardo Paes (PMDB)
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Folha - A Secretaria de Economia Criativa foi extinta em 2015. Hoje, o que há é a Secretaria de Economia da Cultura, cuja definição abarca apenas atividades culturais. Como o ministério irá tratar o tema?
Sérgio Sá Leitão - A diferenciação entre as duas denominações diz mais respeito a uma discussão acadêmica. Do ponto de vista do ministério, nós atribuímos o mesmo sentido. O objeto é o mesmo.
Estamos falando das atividades culturais e criativas que têm duplo valor, simbólico e econômico. São baseadas na criatividade humana e têm dimensão cultural porque trazem em si valores, modos de ser e de pensar que são próprios da cultura. Esse assunto, para nós, é uma prioridade.
Por quê?
Criatividade não se estoca. Matérias-primas de outras atividades econômicas são estocáveis. Se você não usa num determinado momento, guarda para depois. Mas a criatividade, provavelmente, se vai. Há uma urgência de desenvolvermos maneiras de aproveitar melhor a nossa vocação para essas atividades que já têm peso econômico muito grande e apresentam potencial gigantesco. Se esses setores forem estimulados pelo poder público, se tiverem mais investimentos privados e instrumentos de crédito, sua participação no PIB aumentará.
Tentativas foram feitas, mas nada se conseguiu. Por quê?
Até agora falhamos, de um lado, em sensibilizar o conjunto da sociedade, os políticos e o governo, e, de outro, em formular um conjunto de políticas mais eficientes. É o desafio que disponho a enfrentar.
Coloquei como meta, ao fim de 2018, deixar o ministério dotado de um conjunto de diretrizes, políticas e ações voltadas à economia criativa.
Em relação a por que as pessoas não dão o devido valor à área, tem a ver com a mentalidade. Como ainda temos uma matriz econômica muito industrial e baseada em commodities, isso molda o modo de ser e pensar da sociedade.
As pessoas valorizam muito mais setores que já não têm peso econômico muito significativo ou têm peso inferior ao da economia criativa. Há dificuldade de enxergar essas atividades culturais e criativas por sua dimensão econômica. São encaradas muito mais pelo lado da festa, do entretenimento e da diversão.
Então, a secretaria deveria estar dentro da pasta da Cultura?
Temos que mudar a forma com que o ministério vem historicamente tratando a questão. Na gestão do ministro Gil [2003-2008], houve uma sinalização importante nesse sentido. Depois, o tema foi secundarizado e, agora, volta à tona.
A economia criativa faz parte do escopo do Ministério da Cultura, mas não apenas. É fundamental que atuemos em articulação com Ministério da Indústria, do Comércio Exterior e Serviços, com BNDES e Sistema S. Com o IBGE, vamos definir finalmente a criação da conta satélite de cultura, um levantamento contínuo com dados da cultura e da economia criativa. É importante tanto para os empreendedores quanto para a formulação de políticas públicas.
Como pretende fomentar setores criativos com um orçamento tão comprometido?
Temos a lei federal de incentivo à cultura [Roaunet], na qual temos teto de renúncia fiscal de R$ 1,1 bilhão. Vamos desburocratizar a gestão da lei para que os processos sejam mais rápidos e simples.
Também estou defendendo a inclusão de áreas mais ligadas ao campo criativo, mas que têm dimensão cultural e econômica, como, por exemplo, a gastronomia.
Queremos que a lei contemple os "endowments" -fundos patrimoniais de caráter permanente, muito adequados ao financiamento de museus, orquestras, companhias de dança. Vamos trazer também o crowdfunding. Defendemos que as pessoas possam usar parte do Imposto de Renda para participar do financiamento coletivo de projetos.
Outra diretriz seriam os fundos de investimento em cultura, algo já previsto na lei, mas, da forma como ela foi redigida, não foi possível implementar até agora. Vamos fazer uma mudança na lei para que possam deslanchar.