Folha de S. Paulo


Economistas questionam cautela do Banco Central no corte da Selic

Adriana Spaca/Brazil Photo Press/Folhapress
Economistas questionam cautela do Banco Central. Na foto, o presidente do BC, Ilan Goldfajn

O maior cuidado do Banco Central ao reduzir a taxa básica de juros (Selic) foi visto como uma acertada reação ao cenário político conturbado, mas já há, entre os economistas, quem encare os sinais futuros do BC como um excesso de zelo que pode custar caro a uma economia que ainda se recompõe.

Na quarta (31), a taxa Selic foi reduzida em um ponto percentual, de 11,25% para 10,25% ao ano, confirmando o que era esperado pelo mercado diante das incertezas disparadas pela delação da JBS.

No mesmo dia, no entanto, o Copom (Comitê de Política Monetária) indicou que o corte na próxima reunião, em julho, deverá ser menor, de 0,75 ponto percentual.

Confira a evolução da taxa Selic - Em % ao ano

A justificativa para o maior conservadorismo é que a crise impõe dúvidas sobre o futuro das reformas, o que levaria os gastos públicos ao descontrole. Mais à frente, isso poderia elevar a inflação e reduzir o espaço para juros menores.

A questão, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, é se há necessidade de sinalizar um corte menor agora diante de um cenário de inflação tão favorável e de uma atividade econômica tão ruim.

Com uma inflação esperada de 3,95% no fim de 2017, abaixo, portanto, da meta de 4,5%, a avaliação é que o Banco Central poderia aguardar por sinais mais claros do ajuste fiscal.

Inflação (IPCA) acumulada nos últimos 12 meses - LINHA FINA

E pisar no freio apenas se o ajuste desandasse completamente, causando uma piora no câmbio que acabasse por acelerar a inflação.

Para Vale, o BC indicou de que não acredita mais na aprovação da reforma e já se antecipa ao que virá.

"Vai, infelizmente, ajudar a aprofundar a desaceleração no segundo semestre sem razão de ser", diz ele, em referência às expectativas de que, levado pela crise política, o PIB (Produto Interno Bruto) pode voltar a recuar nos próximos meses depois de crescer 1% do primeiro trimestre.

Embora tenha interrompido oito trimestres consecutivos de queda, o número de janeiro a março se deveu mais ao desempenho espetacular do setor agropecuário.

CRÉDITO

Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, ressalta que um dos efeitos de juros mais altos é encarecer as condições de crédito - o que é ruim para a recuperação da economia.

Embora o juro pago pelo consumidor nos empréstimos que faz no dia a dia fiquem muito acima do juro básico, a taxa Selic acaba servindo de baliza para o crédito como um todo.

Oliveira tem a avaliação, no entanto, de que até a próxima decisão de juros, no fim de julho, há muita água para rolar.

A inflação muito baixa, a economia patinando e, principalmente, o imbróglio político já solucionado, diz ele, devem fazer com que os juros voltem a cair em um ritmo mais rápido.

Para Rodrigo Melo, da gestora Icatu Vanguarda, o BC faz o seu papel. "Na incerteza, o melhor é ter mesmo uma posição conservadora. É gerenciamento de risco."

Melo reconhece que a atitude pode ter um efeito adicional negativo sobre a economia, mas esse é apenas um lado da história.

O outro lado, diz, diante de uma piora do cenário político, seria encarar uma inflação maior e ter de voltar atrás.

A posição do BC, diz Fábio Silveira, sócio diretor da consultoria MacroSector, é apenas preventiva. "Todo o mundo sabe que há consumidores e, principalmente, empresas sangrando em meio ao alto endividamento."

Os juros vão continuar caindo, diz, porque a questão econômica está à frente das questões políticas".


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