Folha de S. Paulo


Operador usa robô para manipular mercado

Paulo Whitaker/Reuters
BC diz que vai atuar contra efeitos da crise nos mercados
Ordens de compra e venda são dadas por robôs e canceladas em microssegundos

A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) investiga possíveis práticas de manipulação de preços de ativos financeiros, como ações, por meio de robôs.

Um caso em específico deve ir a julgamento em breve, segundo Henrique Machado, diretor da autarquia. "A CVM vai dar as cores de como encara esse tipo de processo."

Participantes do mercado dizem que essas práticas –chamadas de "spoofing" e "layering" (algo como "enganar" e "sobrepor", em inglês)– são frequentes.

A partir dos robôs, operadores ("traders") emitem ordem de compra ou venda para determinado ativo, mas cancelam a operação em questão de microssegundo.

No caso do "spoofing", as ordens acontecem em grande volume. Já o "layering" é formado por um conjunto de pequenas ofertas.

Em ambas as situações, os programas criam uma falsa demanda, levando investidores, por exemplo, a comprar papéis com valores inflados artificialmente. "Nenhuma ordem é executada, são apenas informações no sistema", diz o advogado Bruno Furiati, especialista em mercado de capitais e sócio do escritório Sampaio Ferraz Advogados.

COMPRAR UMA AÇÃO POR PREÇO MAIS BAIXO

Os robôs têm sua programação, que pode se alternar ou não durante o dia.

Segundo um integrante de mercado financeiro com 40 anos de experiência, os robôs também combinam de puxar o preço, com um comprando dos outros.

REGULAMENTAÇÃO

No Brasil, a instrução CVM nº 8, de 1979, veda condições artificiais de demanda ou oferta, assim como manipulação de preços e operações fraudulentas. Não há uma norma específica contra "spoofing" ou "layering".

Segundo a autarquia, a regulamentação está em constante modernização, em razão de diversos fatores, como estruturas inovadoras, experiência da supervisão, demanda de agentes de mercado, entre outros.

VENDER UMA AÇÃO POR PREÇO MAIS ALTO

Caio Weil Villares, presidente da Ancord (Associação Nacional das Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, Câmbio e Mercadorias), diz que a BSM, braço de supervisão de mercados da Bolsa, tem feito um acompanhamento de práticas ilegais, com pedidos de explicação para corretoras e até mesmo advertências ou punições às instituições.

"Da mesma forma que os robôs se desenvolvem, as ferramentas para monitorar essas práticas também evoluem. O regulador não está dormindo", diz Villares. Segundo Machado, da CVM, ainda não dá para avaliar a magnitude dessas práticas. "O primeiro caso será o paradigma", enfatiza, sem entrar em detalhes.

ESTADOS UNIDOS

Nos Estados Unidos, Michael Coscia, diretor da gestora Phanter Energy, foi condenado, em 2015, por praticar "spoofing" em contratos futuros de commodities.

"Nesse caso, o Ministério Público se baseou no testemunho de um programador responsável por criar algoritmos pedidos por Coscia e anotações que indicavam o desejo de que o mercado 'turbinasse'. Esse foi o primeiro caso criminal de 'spoofing'", afirma Furiati.

Também em 2015, o operador britânico Navinder Singh Sarao foi acusado de realizar "layering" envolvendo contratos futuros na Bolsa de Chicago. No âmbito administrativo, segundo o advogado, há diversas ações da SEC (Securities and Exchange Commission), órgão regulador do mercado de capitais norte-americano. Desde 2010, o país tem uma regra para combater práticas de "spoofing" no mercado de derivativos.


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