Folha de S. Paulo


Fundo gerido pela Caixa dá nó financeiro na zona portuária do Rio

Eduardo Knapp/Folhapress
turistas e moradores caminham pela região, ao lado do Museu do Amanhã, na zona portuária do Rio de Janeiro
Pessoas caminham pelo Boulevard Olímpico, ao lado do Museu do Amanhã, na zona portuária do Rio

A crise no setor imobiliário provocou um nó financeiro na revitalização da região portuária do Rio e uma ameaça de prejuízo ao FGTS.

Seis anos após comprar os 6,4 milhões de títulos imobiliários da região, o Fundo de Investimento Imobiliário Porto Maravilha, gerido pela Caixa Econômica Federal, reconheceu oficialmente que os papéis estão encalhados.

Com o mercado retraído, as construtoras não se interessaram pelos títulos, que autorizam a construção de prédios mais altos do que o permitido na área.

O problema é que o financiamento de obras e serviços públicos na região, como coleta de lixo e iluminação pública, é feito a partir da revenda desses documentos, chamados Cepacs.

Sem interesse do mercado, a Caixa não cumpriu o ritmo de repasses acordado na compra dos títulos da Prefeitura do Rio, que usa o dinheiro para pagar a concessionária Porto Novo, responsável pelas intervenções na região.

A zona portuária é um dos principais símbolos das obras de infraestrutura realizadas para a Olimpíada -e também é citada em casos de propina na Operação Lava Jato.

A maior parte (86%) dos trabalhos já foi concluído, inclusive os mais emblemáticos como o Boulevard Olímpico, o Museu do Amanhã, túneis e a derrubada da Perimetral.

Já foram gastos cerca de R$ 5 bilhões no local. O planejamento prevê outros R$ 5 bilhões em obras e prestação de serviços públicos até 2026.

Ao comprar os títulos em 2011, o fundo imobiliário se comprometeu a repassar todo o valor ao longo dos 15 anos. Para isso, usou inicialmente R$ 3,5 bilhões do FGTS.

A intenção era que o restante fosse quitado ao longo do tempo com a venda dos papéis e de terrenos da área, a que o fundo também obteve o direito. E esperava-se que o investimento gerasse remuneração extra para o FGTS.

DUROU POUCO

O "boom imobiliário" que a cidade vivia em 2011, porém, durou pouco. A crise econômica se abateu sobre o país justo quando as primeiras obras foram concluídas, momento em que a Caixa esperava atrair investidores. Com isso, menos de 10% dos Cepacs foram revendidos.

O banco também firmou acordos para obter participação em empreendimentos usando os títulos como ativo -o que eleva esse percentual para cerca de 34%.

Mas como poucos empreendimentos saíram do papel, e o retorno do investimento só ocorrerá no longo prazo, após o mercado se reerguer.

Em 2015, o FGTS socorreu o fundo da Caixa com mais R$ 1,5 bilhão para manter o cronograma de desembolsos. Em maio de 2016, porém, o fundo ficou de novo sem dinheiro, prejudicando o início da sexta etapa de obras na região, orçada em R$ 1,2 bilhão.

SEM DINHEIRO

Em documento obtido pela Folha, a Caixa afirmou na época que seu fundo está em "situação de iliquidez" em razão da retração do mercado. A comunicação é um instrumento contratual no qual os repasses podem ser suspensos. Um novo aporte de socorro do FGTS é descartado.

O fundo imobiliário tinha disponível naquela data apenas R$ 217,7 milhões. A gestão Eduardo Paes (PMDB) decidiu, ainda assim, iniciar a sexta etapa do projeto usando o dinheiro da Caixa como fôlego inicial. Após a Olimpíada, o ritmo das obras no porto foi reduzido.

Em 28 de dezembro do ano passado, a três dias do fim da gestão de Eduardo Paes, a prefeitura comprou R$ 62,5 milhões de títulos imobiliários para socorrer o Fundo de Investimento Imobiliário Porto Maravilha e, assim, quitar algumas dívidas com a concessionária.

A prefeitura aceitou também receber R$ 725,9 milhões nesses títulos imobiliários como garantia para quitar futuros débitos com a concessionária. Contudo, assim como a Caixa, o município não consegue revendê-los agora no mercado em razão da crise.

A Porto Novo não os aceitará como forma de pagamento, segundo a Folha apurou.

O acordo previa também que o município aportasse mais R$ 219,6 milhões a serem usados para pagar, com recursos próprios, a concessionária da região. Entretanto, a gestão Marcelo Crivella (PRB) decidiu não fazer a transferência.

A dívida com a Porto Novo já chega a R$ 40 milhões.

O atraso nas obras prejudica até mesmo o desenvolvimento dos empreendimentos que podem ajudar o fundo da Caixa a se recapitalizar.

Uma das intervenções a serem feitas é na avenida Francisco Bicalho, onde o banco pode obter o maior retorno do investimento -lá podem ser construídos os prédios mais altos, de até 50 andares.


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