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Secretário de MG espera receber em novembro por acerto com União

Fernanda Carvalho/"O Tempo"/Folhapress
José Afonso Bicalho, secretário da Fazenda de Minas Gerais
José Afonso Bicalho, secretário da Fazenda de Minas Gerais

Para equilibrar as contas deficitárias, o governo de Minas Gerais dá como certo que a União vai pagar bilhões em ressarcimento pela Lei Kandir, que instituiu uma desoneração do ICMS nas exportações de produtos primários em 1996.

Os benefícios fiscais foram constitucionalizados em 2003, com a previsão de uma lei complementar que definisse os termos das compensações das perdas dos Estados em favor da União. Em novembro do ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) deu um prazo de um ano para que o Congresso aprove a legislação ou o acerto ficará a cargo do TCU (Tribunal de Contas da União).

"O governo não sentia essa obrigação, mas, com a decisão do Supremo, é obrigado a fazer isso. Se o Congresso, que até hoje omitiu, não fizer, o TCU vai fazer. Já tem data marcada. A partir de novembro, sabemos que vamos receber", diz à Folha o secretário da Fazenda de Minas, José Afonso Bicalho.

Minas tem rejeitado o programa de recuperação dos Estados desenhado pelo governo federal, que inclui a privatização de estatais e corte de gastos. O governo de Fernando Pimentel (PT) propõe a criação de fundos para levantar R$ 20 bilhões.

Uma das propostas prevê que o Estado pague aluguel a si mesmo e gerou críticas da oposição. Na entrevista à Folha, Bicalho afirma que a operação funciona "como um empréstimo normal".

Leia trechos da entrevista.

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Folha - Se o Congresso não aprovar o ressarcimento da Lei Kandir, se demorar ou o governo vetar, há plano B?
José Afonso Bicalho - Não. A União não pode ultrapassar novembro deste ano. Tem uma decisão do Supremo que diz que, se até novembro a Câmara não aprovar nada de como vai ser esse ressarcimento, o TCU (Tribunal de Contas da União) possa fazer. Já tem data marcada. A partir de novembro, sabemos que vamos receber.
O que estamos discutindo é até quando retroage. Temos hoje uma estimativa do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) de quanto que cada Estado perdeu. Estamos discutindo com Congresso e União o quanto disso eles vão nos ressarcir.

O governo não trabalha com a possibilidade de não receber esse dinheiro?
Lógico que não. Porque a Câmara vai ter que aprovar alguma coisa. E não é só Minas, tem Pará, Rio Grande do Sul, Mato Grosso. É um interesse federativo. O governo não sentia essa obrigação, mas, com a decisão do Supremo, é obrigado a fazer isso. Se o Congresso, que até hoje omitiu, não fizer, o TCU vai fazer.

Qual é o valor exato que Minas tem a receber?
O valor nominal são R$ 50 bilhões. Atualizado por IGP dá R$ 87 bilhões. Atualizado pela Selic dá R$ 135 bilhões. Qual taxa será usada também será discutido.

Cortar gastos, especialmente com pessoal, não é uma opção?
Na reforma do ano passado, foram extintos vários órgãos. E todos os cargos vagos de concurso que eram efetivos, nós extinguimos. Então, é um gasto que não vai ocorrer daqui para frente. Agora, para trás, o grande problema é a Previdência. Estamos tentando resolver pensando como trazer mais recursos. Os próprios fundos podem cooperar com isso.

Não tem como diminuir o custo da Previdência?
Ter alguma racionalização, tem. Mas é muito pequeno. Porque o Estado não pode mandar ninguém embora.

O governo mineiro poderia fazer uma reforma para os servidores estaduais, como o governo federal cogitou?
Temos que ver o que vai ser feito lá para vermos o que vamos fazer aqui. Por exemplo, se vier uma idade única para todo mundo, imagino que vá ser para o país inteiro. Mas temos que ter uma forma de financiar a Previdência. Estamos propondo que o governo compartilhe com os Estados recursos, como PIS, Cofins e contribuições sobre lucros, que são três tributos que o governo criou transvestidos de contribuições para não repartir com a gente. E poderia estar vinculado estritamente à Previdência.

O governo rejeita o programa de renegociação proposto pelo governo federal?
A linha dos fundos é trazer equilíbrio para as finanças com as próprias forças e pernas do Estado, para não depender da União. São várias iniciativas que provavelmente vão fazer com que a gente não precise entrar nesse programa. Acreditamos que não é a forma correta de fazer. O governo federal deveria deixar cada Estado apresentar qual é a opção dele, como em 1998. Cada Estado fez dentro das suas opções, não houve nenhuma imposição. E agora a União quer impor coisas que nem ela consegue fazer.

Por exemplo?
Eu não sei se consegue, no prazo que o Rio precisa, fazer a privatização da Cedae, porque tem que negociar com os municípios, tem que criar uma sistemática para vender, tem que ter gente interessada. Não é um negócio fácil. A União devia dizer: "Estado você tem que entrar com uma contribuição de tanto, como você quer entrar?". Cada um fazia sua opção.

Minas optaria pelo fundo de aluguel em vez de privatizar a Cemig, por exemplo?
Aluguel, dívida ativa, outra coisa em vez de Cemig. Já fomos ao limite máximo do que podemos vender na Cemig. O Estado tem hoje 33% da Cemig. Se vender ela inteira, o que o Estado capta é muito pouco.

Se os projetos dos fundos forem aprovados na Assembleia, o governo deixa de pagar salários parcelados?
Não necessariamente. Precisa ver com que velocidade vamos receber esses recursos. Alguns fundos são só para investimentos e outros não. Por isso, colocamos as escalas a cada três meses: abril, maio e junho. No fim de maio, vamos rediscutir. Se tiver melhorado, evidentemente o Estado não tem nenhum interesse em manter a escala.


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