Folha de S. Paulo


Para driblar crise, setor de defesa quer mudar a identidade

Buscando driblar crises múltiplas, a indústria brasileira de defesa quer se repaginar. As palavras de ordem são ênfase na área de segurança, internacionalização e, como é padrão nesta setor, mais apoio do governo federal.

Os problemas começam na economia e nos efeitos da Operação Lava Jato. A recessão levou a uma maior instabilidade no gasto militar do governo, o cliente clássico da área de defesa, com uma queda acentuada em 2015.

Embora em 2016 o governo tenha retomado o ritmo de investimentos, gastando R$ 9,15 bilhões, ainda se está longe dos níveis de 2010.

"Falta previsibilidade, programas que não sejam interrompidos", diz Frederico Aguiar, presidente da Abimde (Associação Brasileira de Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança).

Um exemplo é o principal programa da Embraer Defesa e Segurança, o cargueiro e avião-tanque KC-390.

Desenvolvido em conjunto com a Força Aérea Brasileira, que encomendou 28 unidades, o projeto absorveu mais de R$ 4 bilhões em verbas oficiais de 2011 para cá, fora o investimento inicial.

"Estamos em um momento crucial, com o primeiro avião entregue à FAB em 2018 e a licença final, para exportações, no fim do ano que vem", afirma Jackson Schneider, presidente da empresa. Dez países estudam comprar o modelo, cujo programa retomou seu ritmo de investimentos após um baque em 2015.

O Ministério da Defesa ainda não tem definição sobre quais programas serão afetados pelo contingenciamento anunciado semana passada.

DEFESA E SEGURANÇA NO BRASIL - Tamanho do setor, em % do PIB

TAMANHO EM 2014: - R$ 202 bi, dos quais:

No âmbito policial, a Lava Jato afetou os planos de grandes empreiteiras, como Odebrecht e Andrade Gutierrez, que vinham apostando em divisões de defesa e segurança.

A Odebrecht foi subcontratada em 2009 pelos franceses da DCNS para construir o estaleiro e a base dos novos submarinos da Marinha por R$ 1,8 bilhão.

Animada, estruturou um setor de defesa e adquiriu a Mectron, que desenvolve mísseis. Em crise, está negociando a venda da Mectron para a isralense Elbit.

Outra operação investiga lobby feito para a escolha dos suecos na disputa de fornecimento dos novos caças da FAB, mas não deve afetar o negócio em si. E a Embraer foi multada em US$ 200 milhões nos EUA por ter pago propina para vender aviões.

Para enfrentar as questões, a Abimde tenta redefinir a identidade do setor. "Tenho frigoríficos associados aqui, afinal militar precisa comer", afirma Aguiar.

A associação contratou a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas para redimensionar seu tamanho. Do 0,45% do PIB que a defesa "stricto sensu" ocupava em 2014, o número pula para 3,7% com toda cadeia produtiva e a área de segurança.

Segundo o estudo, a segurança estadual movimenta R$ 47 bilhões ao ano, ante R$ 25 bilhões da defesa.

"Esperamos ajuda do governo para ter acesso a crédito e para questões como a homologação de licenças para venda nos EUA. Além disso, compras de polícias poderiam ser orientadas pelo Ministério da Justiça, já que hoje cada Estado faz de um jeito", diz. No mundo, defesa movimenta US$ 1,5 trilhão anuais.

Aguiar diz que espera poder anunciar novidades com o ministro Raul Jungmann (Defesa) durante a LAAD, maior feira de defesa e segurança da América Latina, que começa nesta terça (4) no Rio.

No evento, a Embraer Defesa irá anunciar uma associação externa para sua divisão de radares, visando a propalada internacionalização.

"Mesmo com a crise, mantivemos o número de expositores na casa dos 600 e devemos ter mais do que os 37 mil visitantes da edição passada, de 2015", diz o organizador do evento, Sérgio Jardim.


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