Folha de S. Paulo


Governo acena com garantias para terceirizados para evitar desgaste

Apesar de a Câmara ter aprovado na quarta (22) proposta que libera de forma ampla a terceirização no país, Michel Temer e parlamentares aliados articulam a aprovação de um segundo projeto sobre o tema, agora pelo Senado, com mais garantias aos trabalhadores terceirizados.

Para integrantes do governo, essa é uma forma de reduzir o desgaste para o presidente, que poderá combinar a sanção e o veto de partes de cada projeto. Embora tratem do mesmo tema, os dois textos são distintos nas regras de proteção aos trabalhadores.

O que a Câmara aprovou na quarta-feira e enviou à sanção de Temer é de 1998 e traz apenas três salvaguardas genéricas aos terceirizados.

Terceirização: como fica

Diz que esses funcionários não poderão realizar serviços diferentes daqueles para os quais foram contratados, que terão as mesmas condições de segurança, higiene e salubridade dos empregados da empresa contratante e que estarão abrangidos nas regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) sobre fiscalização.

O que o Senado ainda irá votar foi amplamente debatido em 2015 e tem ao menos 50 itens de proteção aos empregados. Entre outros, restrições para evitar que as empresas demitam os funcionários e os recontratem na sequência como terceirizados e a obrigatoriedade de a empresa contratante fiscalizar se a terceirizada cumpre suas obrigações trabalhistas e previdenciárias.

Terceirização
Entenda a discussão trabalhista

Em conversas reservadas, o presidente teria demonstrado preocupação com as críticas à proposta. Nas palavras de um assessor, a proposta aprovada pela Câmara tem "pontos exagerados" e pode desgastar a imagem de Temer.

O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), disse que a Casa irá votar o segundo projeto nos próximos dias. "Vai ser o projeto para complementar, se for o caso, o projeto na Câmara, porque o Senado é a Casa revisora."

O texto votado na quarta foi desengavetado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como forma de driblar a resistência dos senadores de aprovarem a regulamentação da terceirização.

Apresentado pelo então presidente FHC em 1998, esse projeto fora aprovado na Câmara e modificado no Senado na época, precisando apenas de uma nova votação dos deputados para ir à sanção.

A principal medida do projeto é liberar as empresas a terceirizar qualquer área de sua produção, incluindo aquelas diretamente relacionadas à "atividade-fim", o que vinha sendo barrado por jurisprudência da Justiça do Trabalho.

DISPUTA

Oposicionista de Temer, o relator da proposta no Senado, Paulo Paim (PT-RS), tem insistido no veto à terceirização da atividade-fim.

"Espero votar, no mais tardar, na quinta (30). É possível que possamos votar antes da sanção, para dar oportunidade ao presidente de vetar aquele [aprovado pela Câmara] e sancionar esse."

Representantes do Planalto, Eunício e Maia participaram das negociações para acertar a aprovação dos dois projetos a tempo de Temer poder escolher os pontos que pretende validar.

A Folha apurou que um deles é relativo à exigência de retenção, pela empresa contratante, de tributos que devem ser recolhidos à União. Isso para evitar eventuais calotes de terceirizadas ao governo. Esse ponto consta no projeto que o Senado irá votar.

A liberação para a terceirização ampla faz parte de uma ofensiva do governo para aprovar reformas no Congresso, o que inclui vários pontos de interesse do empresariado. A principal é a da Previdência, que o Planalto espera ver aprovado neste semestre.

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Projetos em conflito

Projeto de 2015 ainda pode passar pelo Senado; veja diferenças

icone terceirização

Responsabilidade das empresas

Como é hoje
O funcionário pode acionar a empresa na justiça para cobrar direitos trabalhistas

Como ficou na Câmara (2017)
O funcionário pode acionar a terceirizada para cobrar eventuais direitos trabalhistas. A contratante tem responsabilidade subsidiária

Como está no Senado (desde 2015)
A contratante e a contratada têm responsabilidade solidária em relação a débitos trabalhistas e previdenciários

Arte terceirização - vinheta 2

Garantias e exigências

Como é hoje
Não há exigência de capital social mínimo

Como ficou na Câmara (2017)
O projeto estabelece faixas de capital social conforme o número de funcionários

Como está no Senado (desde 2015)
Lei exigiria que empresa terceirizada tenha apenas um objeto social, compatível com o serviço contratado

Arte terceirização - vinheta 3

Benefícios trabalhistas

Como é hoje
Trabalhadores que exercem as mesmas funções devem receber benefícios iguais. Se a empresa oferece como benefício um carro a seus gerentes, todos eles têm direito ao carro

Como ficou na Câmara (2017)
O gerente contratado da empresa original terá direito aos benefícios, mas a prestadora do serviço não precisará oferecer o benefício a seus funcionários, mesmo que exerçam o mesmo cargo na empresa tomadora

Como está no Senado (desde 2015)
Funcionários da empresa original e da prestadora de serviço teriam benefícios equiparados

Arte terceirização - vinheta 4

Direitos trabalhistas

Como é hoje
Trabalhador tem direito a férias de 30 dias com adicional de um terço do salário, 13º salário, FGTS, hora-extra, licença-maternidade e licença-paternidade, adicional noturno, aviso prévio e seguro-desemprego, entre outros

Como ficou na Câmara (2017) e como está no Senado (desde 2015)
Permanecem os mesmos. O que muda é que o contrato de trabalho é lavrado entre a prestadora e o terceirizado

Arte terceirização - vinheta 5

Atividade que pode ser terceirizada

Como é hoje
Atividades-meio. Um escritório de contabilidade pode contratar uma empresa para fazer a limpeza do local, mas não contadores, que é sua atividade-fim

Como ficou na Câmara (2017) e como está no Senado (desde 2015)
Em tese, a empresa de contabilidade poderia terceirizar a contratação de contadores. Mas há a avaliação de que, por se tratar de ponto estratégico, não faria sentido

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Exemplos de terceirização

O que muda e o que fica igual com o projeto aprovado na Câmara

EXEMPLO 1: Um profissional responsável pela pintura na linha de produção de uma fábrica de peças de móveis

Como é hoje

Arte terceirização - exemplo2

Ele é empregado da fábrica. Por fazer parte da atividade-fim (fabricar carros), não pode ser terceirizado

O que muda

Arte terceirização - exemplo1

Por ter uma função especializada, ele pode ser terceirizado. Ele continua tendo carteira assinada e direitos trabalhistas, mas com a prestadora de serviços, e não com a montadora

O que não pode
A montadora não pode tratá-lo como empregado, ou seja, direcionar seu trabalho, controlar suas faltas ou a sua jornada de trabalho

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EXEMPLO 2: Uma tradutora presta serviços diariamente em uma empresa privada, mas é "pejotizada", ou seja, recebe como pessoa jurídica

Como é hoje

Arte terceirização - exemplo 2

Se há subordinação ao chefe, não é uma relação eventual e há pessoalidade, é uma relação de emprego, ou seja, é ilegal contratar como pessoa jurídica

O que muda
Nada. A situação continua ilegal

O que não pode
A empresa pode terceirizar seus serviços de tradução, mas não pode manter uma relação de trabalho com a tradutora sem formalizar os direitos


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