Folha de S. Paulo


Cade aprova com restrições negócio de R$ 12 bilhões entre Bolsa e Cetip

Daniel Marenco - 4.ago.2011/Folhapress
SÃO PAULO, SP, BRASIL, 04-08-2011, 16h30: Funcionários da Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo) observam o painel no prédio da Bolsa, centro de São Paulo (SP), em dia de forte queda dos negócios. As Bolsas caíram na Ásia, na Europa e nas Américas. A Bovespa fechou em queda de 5,72%. Só ficou à frente da Bolsa de Buenos Aires, que desabou 6,01%. Foi a maior derrocada desde novembro de 2008. (Foto: Daniel Marenco/Folhapress, 4915, MERCADO)
A BM&F Bovespa anunciou a compra da Cetip, câmara depositária de títulos, por R$ 12 bilhões

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) aprovou com restrições nesta quarta-feira (22) a compra da Cetip pela BM&FBovespa, um negócio de R$ 12 bilhões.

A Bovespa e a Cetip operam com negócios diferentes, mas complementares. Na Bolsa, são comercializadas ações de empresas. Na Cetip, são feitas as transações envolvendo títulos de renda fixa, como CDBs, LCAs, entre outros.

A princípio, a Bolsa poderia entrar no negócio da Cetip que, por sua vez, também poderia criar uma estrutura similar à da Bolsa para também negociar ações. Mas isso nunca aconteceu. No passado, outras empresas tentaram criar Bolsas concorrentes, mas as tentativas fracassaram.

Hoje, quando uma corretora vira cliente da BM&FBovespa, precisa pagar uma taxa para se conectar eletronicamente aos sistemas de negociação e transferência das ações. Essa taxa é repassada a seus clientes, que emitem as ordens de compra e venda dos papéis. A Cetip também cobra para a compra e venda de títulos de renda fixa.

Como antecipou a Folha, o conselho não aceitou o voto da relatora do caso Cristiane Alkmin –considerado "duro demais"– e permitiu a transação desde que seja criado um comitê de arbitragem para decidir conflitos entre a Bovespa e possíveis concorrentes.

A solução foi apresentada pelas próprias empresas há cerca de duas semanas, quando a conselheira se retirou das negociações.

Em seu pronunciamento durante a votação, Alkmin disse concordar com essa solução, mas que ela só faria sentido se fossem impostas condições prévias ao árbitro. Dentre elas: o controle objetivo das regras de acesso aos sistemas da Bolsa (para evitar demora ou tratamento discriminatório) e de preço (para evitar abusos de preço que inviabilizem a concorrência).

A maioria dos conselheiros optou por uma saída "light" porque entendeu não ser função do Cade regular mercados. No caso, esse papel é exercido pelo Banco Central e pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

Até hoje, porém, não existe uma regulação da CVM para quem quer entrar no mercado da Bolsa.

REGULADOR

Em muitos outros casos, no entanto, o Cade tomou decisões que cobriram buracos regulatórios. Foi assim em fevereiro de 2015 na fusão da ALL com a Rumo Logística. Para permitir o negócio, o conselho forçou a passagem de trens concorrentes em sua malha corrigindo "falhas do mercado". O setor é regulado pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).

Também foi assim no passado com um caso entre a GVT e a Oi envolvendo tarifas de interconexão cobradas entre as operadoras pelo compartilhamento de redes. Os preços elevados cobrados pela Oi (que tinha mais poder de mercado) dificultavam a inserção da GVT no mercado.

A compra da Cetip pela BM&FBovespa não é diferente. Tanto que a ATS, empresa que pretende criar uma Bolsa concorrente, entrou como parte interessada no processo como uma forma de "esclarecer" as distorções que hoje permitem à Bolsa permanecer como "monopolista" e margens de lucro acima de 60% desde 2007.

Muitas empresas tentaram ser concorrentes da Bolsa no Brasil nos últimos anos, mas desistiram diante dessas "falhas concorrenciais" hoje reveladas na sessão do Cade.

Para se implantar no país, muitas precisariam usar parte dos sistemas de negociação da BM&FBovespa. Segundo elas, a Bolsa sempre criou barreiras para o acesso aos sistemas (demora excessiva em dar respostas) e cobrou preços tão elevados que, na prática, inviabilizaram a competição.

A Bolsa sempre afirmou e, repetiu dessa vez ao Cade, que seu preço reflete seus custos. Mas nunca abriu a composição desses custos.

No processo, um estudo contratado pela ATS –que foi parte interessada– e feito pela consultoria Oxera revelou que os preços da BM&FBovespa estavam 22 vezes acima da média mundial.

Em comunicado, a Bolsa informou que cumprirá todas as condições impostas pelo Cade e que vai garantir tratamento isonômico às empresas que quiserem atuar nesse mercado.

Em nota, a ATS considerou que o conselho agiu "de forma adequada e contundente" ao obrigar a BM&FBovespa e a Cetip a celebrarem acordos de prestação de serviço com as novas entrantes.


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