Folha de S. Paulo


Crítica

Livro traz história improvável da expansão global do Airbnb

Jim Wilson/The New York Times
Da esq. para a dir., os cofundadores do Airbnb Brian Chesky, Nate Blecharczyk e Joe Gebbia
Da esq. para a dir., os cofundadores do Airbnb Brian Chesky, Nate Blecharczyk e Joe Gebbia

Em 2008, três jovens com pouco mais de 20 anos estavam endividados e prestes a fechar sua empresa excêntrica que permitia a viajantes pagar para dormir na casa de estranhos, com direito a colchão inflável e café da manhã.

Para evitar a falência, compraram mil caixas de cereal, as desmontaram, as estilizaram com caricaturas dos candidatos presidenciais Barack Obama e John McCain e as remontaram. Cada uma delas foi vendida a US$ 40.

Os cereais, ao contrário do site, foram um sucesso imediato, o que deu fôlego à companhia agonizante.

Oito anos depois, aqueles empreendedores que aparentavam rumar a um retumbante fracasso se juntavam ao agora presidente Obama. Faziam parte de uma delegação de empresários que o acompanhava em visita a Cuba, para celebrar o reestabelecimento das relações comerciais entre a ilha e os Estados Unidos.

Do alto do palco, o presidente fez questão de ressaltar o valor bilionário da empresa criada pelos três e a juventude de seu presidente e cofundador, Brian Chesky, então com 34 anos.

A história de como o Airbnb conseguiu, a partir de uma ideia que parecia a muitos assustadora, se tornar um gigante da internet é contada pela jornalista da revista "Fortune"Leigh Gallagher em seu livro "The Airbnb Story" [A história do Airbnb, ainda sem tradução no Brasil].

A companhia, que permite o aluguel de casas e quartos pela internet, atua em 34 mil cidades de 191 países e tem mais de 2.500 funcionários. Seu principal ativo são os milhões de anfitriões que alugam seus espaços e, nas palavras da autora, tornam o Airbnb um movimento.

COLCHÕES INFLÁVEIS

O ponto alto da obra é o relato dos primeiros dias da start-up, quando dois designers que dividiam um apartamento e buscavam alguns trocados criaram um site para hospedar turistas com três colchões infláveis que guardavam.

A ideia era atrair participantes de um grande evento que lotou os hotéis da região e, depois, achar uma ideia de negócios melhor.

A autora trata dos primeiros hóspedes do serviço, das muitas negativas de investidores e de como os sócios estiveram perto de desistir.

Também mostra como o Airbnb teve crescimento avassalador após ser selecionado para um programa de apoio a start-ups da aceleradora Y Combinator e receber seguidas injeções de capital fundos de investimento.

A obra coloca em seu devido lugar o pioneirismo da empresa, apontando que o aluguel de casas por temporada na internet existia desde os anos 1990 e mesmo dividir a casa com estranhos já era possível, a partir de serviços como o Couchsurfing.

Entre os muitos fatores que fizeram o Airbnb sair de um nicho e chegar às massas, segundo a autora, estão a união de site intuitivo, pagamento on-line fácil e prático, design atraente e a crise financeira de 2008, que tornou a opção de alugar espaços não convencionais mais atraente para viajantes e anfitriões.

POLÊMICAS

O que incomoda no livro é que a história de empreendedorismo está separada de todas as polêmicas que envolvem a empresa.

Completo, porém esquemático, o livro segue com um capítulo diferente para cada assunto que trata.

Em um, estão os problemas nas relações entre hóspede e proprietário. Estão ali casos de depredação de casas, ameaças de estupro, mortes trágicas acidentais de turistas e a inabilidade da companhia para gerenciar essas questões em seus primeiros anos.

Em outro, estão disputas que a empresa acumulou por trazer ameaças ao mercado hoteleiro e imobiliário e frequentemente ultrapassar os limites da lei. A autora relata batalhas judiciais acerca de questões como proibição para alugar casas inteiras por menos de 30 dias em cidades como Nova York.

O resultado é que a narrativa da evolução da empresa sai prejudicada, devido às muitas idas e vindas do livro.

Gallagher teve acesso a fundadores e executivos da companhia. Slogans e falas de sócios, diretores, advogados e lobistas estão espalhados pelas páginas do livro.

Apesar de ter colaborado com a obra, Chesky disse à autora se sentir incomodado com o fato de que o livro ficaria logo desatualizado.

Aparentemente ele acertou. Neste mês, a companhia anunciou ter recebido uma nova injeção de investimento, de US$ 1 bilhão.

Mesmo assim, o livro serve como uma boa leitura para quem quer entender a empresa e seu impacto no mercado, no turismo e na cultura.


Endereço da página: