Folha de S. Paulo


Análise

Idade diferente para se aposentar compensa desigualdade de gênero

Alan Marques - 21.fev.2017/Folhapress
Presidente Michel Temer ao lado do ministro Henrique Meirelles e presidente da Câmara, Rodrigo Maia
Presidente Michel Temer ao lado do ministro Henrique Meirelles e presidente da Câmara, Rodrigo Maia

A casa presidida pelo deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem apenas 10,7% de seus assentos ocupados por congressistas mulheres, gênero que representa mais de 51% da população brasileira.

O percentual brasileiro de parlamentares do sexo feminino é menos da metade da média mundial (23,4%). Fica ainda aquém da participação de mulheres nas câmaras baixas de países do Oriente Médio (18,9%), célebres por restringir sua autonomia e direitos.

Essa baixa representatividade feminina, e consequente falta de debate e poder de decisão sobre questões de seu interesse, pode ter contribuído para a análise feita pelo presidente da Câmara sobre a proposta de reforma da Previdência do governo Temer, que enraiveceu as mulheres, feministas ou não.

Para Maia, ao igualar em 65 anos a idade mínima de aposentadoria para homens e mulheres, a reforma responde a um "pleito histórico de um equilíbrio na relação de gênero em todos os temas da sociedade". Hoje em dia, há distinção: 60 anos para elas, 65 para eles.

Com isso, o deputado confunde a luta feminista por igualdade no mundo de trabalho (e nas ruas, nas relações pessoais, nas instituições etc.) com a extinção de um mecanismo compensatório dos desequilíbrios experimentados pelas mulheres ao longo de suas trajetórias profissionais, dentro e fora de casa.

Dados mais recentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam que a diferença na carga de trabalho entre homens e mulheres não só é bastante díspar como aumentou nos últimos anos.

Em 2005, as mulheres trabalhavam 6,9 horas a mais por semana que os homens; em 2015, essa diferença subiu para 7,5 horas, somando-se o trabalho formal e o doméstico, a chamada dupla jornada.

Isso ocorre ainda que o tempo de dedicação das mulheres aos afazeres domésticos tenha diminuído (algo que pode ser atribuído ao acesso a eletrodomésticos) porque o tempo de dedicação dos homens a atividades profissionais foi reduzido em 3 horas.

A taxa de ocupação de mulheres e homens também evidencia essa desigualdade: segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), apesar de serem a maioria entre as pessoas em idade de trabalhar (52,2%), elas representam 42,8% das pessoas ocupadas contra 57,2% dos homens. A falta de vagas em creches é um dos fatores que detém a mulher de obter trabalho.

Entre elas, a taxa de desemprego é maior que entre os homens, ainda que as mulheres sejam a maior parte da população economicamente ativa com nível superior.

Como se não bastassem os obstáculos à inserção no mercado de trabalho, uma vez nele, a mulher recebe 76% do salário de homens na mesma posição. A diferença já foi maior: 71% em 2005, segundo o IBGE.

Estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) com base nos dados da Pnad aponta também que, com esse salário inferior, o percentual de lares chefiados por mulheres saltou de 23% para 40% em 20 anos.

Apesar de algum avanço na disparidade de gênero no mercado de trabalho, todo esse quadro aponta que, sem resolver as desigualdades que precedem a aposentadoria, fica difícil igualar os critérios para obtenção do benefício sem apenas aprofundar esse desequilíbrio.


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