Folha de S. Paulo


Para driblar crise, indústria da moda busca peças baratas mas polivalentes

Eduardo Anizelli/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 28-10-2016, 13h30: Desfile da grife MEMO, na Sala Ibirapuera, no Parque do Ibirapuera, em Sao Paulo. (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress, ILUSTRADA)
Desfile da grife Memo na São Paulo Fashion Week, em São Paulo

"Por mais que a peça conceitual seja importante na moda, a vitrine tem de ter o que o cliente precisa e pode comprar."

A frase de Rafael Zolko, sócio da marca de roupas femininas TVZ, resume a situação que vive a indústria da moda para tentar sair da crise.

Se por um lado a queda nas vendas a obrigou a optar por produtos mais baratos para reduzir os preços para não perder vendas, de outro não pode deixar as roupas perderem o brilho sob o risco de não agradar o consumidor, agravando o problema.

Em 2016, foram produzidas 5,4 bilhões de peças de vestuário no Brasil, uma queda de 6,7% em comparação com o ano anterior. Já as vendas no varejo caíram mais de 10%, segundo a Abit (associação de indústria têxtil).

A solução foi passar a ofertar itens "o mais comercial possível", segundo Zolko –como macacões e vestidos, cujas vendas na TVZ se mantiveram estáveis desde o aprofundamento da recessão.

"Peças únicas resolvem o visual completo com bom custo benefício para o consumidor", afirma o empresário.

Com a crise, aponta Fernando Pimentel, presidente da Abit, os lojistas estão mais conservadores na oferta de peças extravagantes,e os clientes estão menos dispostos a comprar itens de pouco uso.

"Pela própria queda do poder aquisitivo do consumidor, a tendência é ofertar produtos de menor risco", diz Pimentel. Assim, o varejo passou a evitar peças que podem não cativar o consumidor e encalhar no estoque.

Por outro lado, alerta Edmundo Lima, diretor da Abvtex (associação que reúne varejistas como C&A e Marisa), se os concorrentes reduzem suas coleções a itens básicos e similares, podem cair na armadilha de se canibalizarem em uma guerra de preços.

É preciso, portanto, encontrar o equilíbrio entre preservar algum diferencial, mas sem inovar demais.

SEM MODINHA

A saída escolhida por grandes lojistas, aponta Lima, foi lançar um produto "menos modinha", que pode ser usado por mais tempo.

Estampas grandes, decotes exagerados, saias curtas demais e paetês em excesso –peças de uso limitado a ocasiões específicas– saíram das vitrines e deram espaço a roupas polivalentes, "que podem ser usadas tanto em festas como em almoços de família", como resume Marcelo Prado, diretor do instituto Iemi, que estuda o setor.

Para o estilista Valdemar Iódice, da rede Iódice, o desafio é equilibrar as cores, evitando excessos e estampas "agressivas", mas sem cair em uma cartela que traga só tonalidades básicas. "Não pode ficar só no bege."

Na Memo, marca esportiva de Patricia Birman –filha de Anderson Birman, fundador da Arezzo–, os últimos dois anos focaram em linhas mais neutras. Essas peças, que ela chama de "essenciais", correspondem à maior parte do que é vendido.

Fátima Brilhante, da marca nordestina Famel, diz ter cuidado ao apostar em "peças-conceito", aquelas que são mais inventivas, geralmente vistas em desfiles.

"Tem que observar as referências que tiveram baixa demanda e reduzi-las no estoque das coleções seguintes."

Na outra ponta, as roupas "campeãs de vendas" –modelos que vendem bem em todas as estações– podem voltar repaginadas.

A estilista Lilly Sarti, cuja marca leva seu nome, diz que tenta fazer uma moda "slow fashion" –o contrário da "fast fashion", a moda barata para consumo rápido, com trocas constantes de coleção– para tentar prolongar a vida útil do guarda-roupa de suas consumidoras.

INDÚSTRIA

A indústria reduziu custos no processo produtivo ao adotar, por exemplo, jeans que desperdiçam menos água durante a lavagem e mesclas de tecidos considerados mais nobres, como o algodão, com fibras sintéticas, que ficaram mais baratas após a queda do preço do petróleo.

O dólar caro em 2016 também ajudou as fábricas nacionais, já que puderam concorrer com os importados, que ficaram mais caros.

"A busca da indústria nacional não se deve só ao câmbio. Também veio porque, em um momento difícil de fazer previsões de demanda, o fabricante nacional responde mais rápido aos pedidos e permite que o varejista compre lotes pequenos", diz.


Endereço da página: