Após forte repercussão de setores contrários ao projeto que muda as regras das telecomunicações no país, a direção do Senado solicitou ao Palácio do Planalto que devolvesse o texto que trata do assunto ao Congresso.
A proposta havia sido enviada pelo então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) para sanção presidencial na noite desta terça-feira (31).
Como informou a Folha, Renan Calheiros usou sua última noite de mandato à frente da Casa para remeter o polêmico texto a Michel Temer.
O projeto já estava na Casa Civil quando, nesta quarta-feira (1º), após publicação da reportagem sobre o assunto, o Senado enviou um ofício solicitando a devolução da matéria.
A decisão de Renan foi fortemente criticada por integrantes da oposição no Congresso, que chegaram a insinuar que a atitude do senador poderia prejudicar a eleição de seu sucessor no comando da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), que ocorreu também nesta quarta.
Em outra frente, a manobra de Calheiros levou um grupo de senadores liderados por Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM) a preparar um recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Antes do recuo da direção do Senado, no início da tarde desta quarta, o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD/SP), chegou a comemorar o envio do projeto para a sanção presidencial.
"É um projeto muito importante para o avanço do setor, assim como foi a primeira Lei Geral das Comunicações, aprovada há 20 anos", disse o ministro à Folha.
Kassab disse estar "muito tranquilo" com relação às mudanças que serão implementadas e que estão sob o ataque da oposição.
CONTROVÉRSIA
O projeto permite que os contratos de concessão da telefonia fixa, único serviço prestado atualmente em regime público, sejam transformados em simples termos de autorização.
Se assim for definido, a telefonia fixa funcionará como os demais serviços —celular, internet e TV paga— hoje prestados em regime privado.
No regime privado, as teles não têm obrigação de levar o serviço em locais que dão prejuízo.
Com o projeto, elas terão essa liberdade na telefonia fixa somente nos locais onde já existe competição.
Nos demais municípios, as regras de investimento e cobertura serão definidas e monitoradas pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), como funciona nos contratos de concessão.
Outra mudança controversa é a possibilidade de que as operadoras que aceitarem migrar de concessão para autorização incorporem os bens usados na prestação do serviço de telefonia fixa. Esses bens seriam devolvidos à União ao término dos contratos de concessão, em 2025.
A oposição diz que esse patrimônio (edifícios, centrais de telefonia e de dados, cabos, entre outros) vale cerca de R$ 100 bilhões.
A Anatel vai calcular esse valor, mas estima-se que o total do patrimônio chegue a algo em torno de R$ 20 bilhões, considerando a depreciação desde a privatização, há quase duas décadas.
Os críticos do projeto também questionam a renovação automática das autorizações. Caberá à Anatel decidir se haverá algum tipo de óbice à renovação dessas licenças. Somente nesse caso uma nova licitação será definida.
"Esses contratos passam a ser vitalícios", disse a senadora Vanessa Grazziotin. "É inaceitável, um absurdo."
O governo se defende dizendo que nada será dado de graça às teles. Elas terão de pagar pela renovação, reinvestir o valor incorporado dos bens na expansão da internet em áreas carentes como parte de um plano nacional de internet que será lançado assim que o projeto for sancionado pelo presidente Temer.
Os senadores de oposição afirmam que não é possível permitir essas mudanças sem que haja mecanismos previamente definidos pelo projeto que garantam o cumprimento das novas regras.