Folha de S. Paulo


Economia grega volta a crescer, mas crise social só piora

Thanassis Stavrakis/Associated Press
Sem-teto troca de roupa do lado de fora de banco em Atenas
Sem-teto troca de roupa do lado de fora de banco em Atenas

Já se passaram mais de 3.000 anos desde que o vilarejo grego de Éfira teve seu momento de fama, ao ser citado por Homero como um dos locais visitados por Odisseu (personagem da "Ilíada" e da "Odisseia").

Nos dias de hoje, porém, Éfira, já não recebe mais estranhos em jornadas heroicas. Com muita sorte, o ônibus local passará por lá mais de uma vez ao dia.

Para quem vive no vilarejo, não é só o passado mítico que os leva a olhar para o passado: moradores dizem que o local não tem mais futuro.

"Nós estamos sob perigo", afirma Aggelos Petropoulos, padeiro e prefeito local. "Tudo está ficando pior. Precisamos de ajuda."

Esse é um pedido que se ouve cada mais na Grécia, depois de mais de oito anos de catástrofe financeira.

O país virou um dos exemplos clássicos dos desastres econômico, político e social que aconteceram após a crise global de 2008.

A economia grega encolheu quase um terço nos anos seguintes, e o governo, na prática, está falido se não há ajuda do exterior: ele deve € 320 bilhões, quase o dobro do seu PIB (€ 181 bilhões).

Os efeitos das dificuldades econômicas são sentidos por todo o país. A taxa de desemprego é de 23%, e 44% daqueles que têm entre 15 e 24 anos não têm trabalho. Mais de um quinto dos gregos vivem sem algum item básico, como telefone ou aquecimento.

Em 2015%, 15% da população estava na pobreza extrema, ante 2% em 2009, segundo um estudo recente da ONG grega Dianeosis

"Existem famílias que não têm nada para comer", afirma o prefeito de Éfira. "Eu dou pão de graça. Conheço todos aqui e sei quem está precisando mais."

MEMÓRIA DISTANTE

Na metade de 2015, quando a Grécia estava à beira do precipício financeiro, a União Europeia lançou um alerta, dizendo que o rumo da economia grega colocava em risco o futuro europeu.

Depois de meses de disputa política entre o governo grego de esquerda e as autoridades europeias, o país recebeu um pacote de € 86 bilhões, o terceiro resgaste em cinco anos.

Passados 18 meses, a crise grega desapareceu dos pensamentos de muitos na Europa, substituída por acontecimentos como o Brexit (saída do Reino Unido da UE), uma onda de ataques terroristas no continente e as eleições que estão por vir na Alemanha e na França. Mas, na Grécia, a crise continua forte.

Ainda que o país esteja melhor financeiramente do que há dois anos, a crise social piorou.

Em troca do pacote de resgate, as autoridades europeias exigiram mais medidas de austeridade.

Os gastos com hospitais, escolas e Previdência Social foram cortados, deixando sem ajuda uma boa parte da população grega.

Autoridades da UE podem até comemorar sinais de que a economia grega está melhorando (teve dois trimestres seguidos de crescimento em 2016 e existe previsão de alta de 2,7% para o PIB deste ano), mas uma virada significativa ainda parece improvável.

Em grande parte, a recuperação vivida pelo país é apenas no papel: a pobreza está aumentando, o desemprego é o mais alto da Europa. Muitas escolas foram fechadas ou tiveram seus orçamentos reduzidos.

Não é raro que a pensão de um aposentado (de pelo menos € 300 mensais) sustente uma família inteira. E a pressão está aumentando.

No ano passado, o pagamento de aposentadorias foi cortado em até 40%. E este ano trará novos impostos sobre carros, telefonia, televisores, combustíveis, café e cerveja (com arrecadação de € 1 bilhão), além de cortes de € 5,7 bilhões nos salários públicos e nas aposentadorias.

Trata-se de um retorno drástico à realidade para muitos gregos, em um país onde, por décadas, a fiscalização tributária foi frouxa, e os benefícios sociais, generosos.


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