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opinião

É hora de desmamar do BNDES as grandes empresas e as múlti

Rafael Andrade/Folhapress
RIO DE JANEIRO, RJ, 30.01.2009: PRÉDIO-BANCO - Prédio do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) na avenida Chile, no centro do Rio de Janeiro. (Foto: Rafael Andrade/Folhapress)
Prédio do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) no Rio

Bancos de desenvolvimento não são jabuticabas e existem em outros países. O BNDES, nosso principal exemplar da classe, foi criado em 1952 para alavancar o processo de industrialização do Brasil por meio da expansão do crédito de longo prazo ainda quase inexistente no país.

Hoje, o BNDES é o maior banco de desenvolvimento do mundo em volume de empréstimos, duas vezes maior que o Banco Mundial, e ainda representa grande parte do mercado de crédito no Brasil.

Mas, se gerou valor no passado, seu modelo de negócios se tornou disfuncional com o crescente acesso aos mercados de capitais internacionais por firmas brasileiras, desde a década de 1990.

O século 21 chegou, e o BNDES continuou o mesmo dos nossos avós. Seu crédito subsidiado não gera aumento de investimentos e seu único efeito parece ser reduzir o custo de capital para as grandes empresas (mais lucro para os acionistas), conforme demonstrado por Sérgio Lazzarini e coautores em artigo na "World Development".

Tal resultado não surpreende, pois juros subsidiados para empresas com acesso a crédito é política Robin Hood às avessas: tira do bolso do trouxa (contribuinte) e engorda o dos acionistas. Hoje, somente pequenas e médias empresas, que realmente têm restrições de crédito, justificariam a existência de um banco de desenvolvimento público.

É hora de mudar. O crédito do BNDES não mais gera crescimento, e suas operações podem ser capturadas por interesses escusos no capitalismo de compadrio. Ainda que riscos sejam mitigados pelo profissionalismo de seu estafe, o balanço de sua política de campeãs nacionais foi negativo.

Hora então de reformá-lo, redesenhando seu modelo de negócios. O S em sua sigla representa o Social. Com uma maior ênfase ao financiamento de projetos de infraestrutura social como saneamento e energia renovável, o BNDES voltaria a fazer jus a seu nome. O D, de Desenvolvimento, pode ser reabilitado com um novo foco em aliviar as necessidades de financiamento de pequenas e médias firmas inovadoras, por meio tanto da originação direta quanto de mecanismos indiretos de crédito.

É hora também de desmamar as grandes empresas e as multinacionais operando no Brasil. Lobistas da indústria vão certamente espernear, alegando que sem o apoio do BNDES seria impossível investir no Brasil no longo prazo ou que estrangeiros deixariam de investir no país, especialmente em projetos de parcerias público-privadas. É uma inverdade, outros países emergentes sem megabancos de desenvolvimento conseguem receber elevados investimentos estrangeiros, e o mercado de capitais tupiniquim já mobilizou bilhões de dólares em IPOs.

Mesmo em projetos de privatização, o BNDES não é mais necessário. Crédito barato torna o ativo estatal mais atraente. Entretanto, o benefício das privatizações está na geração de investimentos privados, nos ganhos de produtividades por gestão superior e na melhora nos serviços via transformação do ambiente de negócios.

Nós aplaudimos a recente decisão de reduzir os aportes do Tesouro ao banco (56% dos fundos do BNDES em 2015). É vital que o BNDES não dependa desses recursos.

Cabe à liderança política determinar o mandato e objetivos estratégicos para o banco. Seguindo regras claras e com responsabilidades definidas, seu excelente corpo técnico tem muito a contribuir para o desenvolvimento do país.

Vamos trazer o BNDES ao século 21!

IRINEU DE CARVALHO FILHO é doutor em economia pelo MIT

RODRIGO ZEIDAN é professor na Nyu Shanghai e na Fundação Dom Cabral


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