Folha de S. Paulo


OMC condena política industrial do Brasil e pede revisão de incentivos

A OMC (Organização Mundial de Comércio) considerou ilegais sete programas da política industrial brasileira. O órgão impôs uma dura derrota ao Brasil ao concordar com todos os pontos questionados por União Europeia e Japão.

Se não quiser sofrer retaliações dos outros países, o governo brasileiro terá que reformar ou abandonar os programas condenados. Entre os setores atingidos, estão automotivo, eletroeletrônico, siderúrgico, açúcar, celulose, mineração e sucroalcooleiro.

Os incentivos fiscais, que chegam a cerca de R$ 7 bilhões por ano, não serão retirados imediatamente, porque o governo deve recorrer da decisão. Pelos trâmites da OMC, o mais provável é que a disputa ainda se arraste por anos como já aconteceu na briga entre Bombardier e Embraer ou no caso do algodão.

A decisão do xerife do comércio mundial, no entanto, pode inibir investimentos no Brasil, porque as empresas não sabem se podem contar com esses subsídios no médio e longo prazo.

Por meio de nota, o Itamaraty informou que a decisão ainda é preliminar e que o Brasil só vai se pronunciar oficialmente quando for divulgado o relatório final, no dia 14 de dezembro.

Boa parte das medidas condenadas pela OMC foram implementadas pela ex-presidente Dilma Rousseff, mas vem sendo mantidas por Michel Temer, que contou com apoio do setor empresarial no processo de impeachment.

No relatório de 402 páginas, a OMC condenou o Inovar Auto, a Lei de Informática, o PADIS (semicondutores), o PATVD (TV digital) e o programa de inclusão digital, além de programas que isentam de impostos as empresas exportadoras (Recap e PEC).

Quando iniciaram o processo, em janeiro de 2014, os europeus também questionavam os benefícios da zona franca de Manaus, mas foram convencidos pelo Brasil a desistir. O país alegou que a zona franca é fundamental para preservar Amazônia.

Considerado o mais frágil dos programas contestados, o Inovar Auto exige que as montadoras mantenham parte da produção no país para usufruir de redução de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Os incentivos ao setor eletroeletrônico funcionam de forma parecida.

Para os árbitros da OMC, os programas violam três regras importantes dos acordos internacionais: não atrelar subsídio a investimento no país, não exigir conteúdo local e não tributar de forma diferenciada produtos importados e nacionais.

Antonio Megale, presidente da Anfavea (que representa as montadoras) diz que já esperava esse resultado, mas que o processo na OMC vai prolongar pelo menos até o fim de 2017, quando já está previsto o fim do Inovar Auto. "Estamos na expectativa da nova política para o setor, que não poderá conter os mesmos elementos condenados pela OMC", disse.

A OMC também considerou ilegais dois programas que permitem ao exportador comprar máquinas e insumos sem pagar tributos. Para os juízes, benefícios fiscais não podem ser vinculados ao desempenho exportador.

O Brasil alegou que esses programas corrigem as distorções provocadas pelo sistema tributário nacional, mas a tese não foi aceita.

Para Diego Bonomo, gerente executivo da CNI (Confederação Nacional da Indústria), a decisão da OMC é uma oportunidade para o Brasil fazer uma reforma tributária. "Dessa forma, atacamos as causas dos problemas, já que esses programas só tratam os sintomas".

-

NA MIRA DA OMC
Principais programas considerados ilegais

Inovar-Auto
As montadoras que executam no Brasil algumas etapas de produção –garantindo que seus produtos tenham no mínimo 65% de conteúdo nacional– recebem em troca isenção no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). O programa foi criado em 2012 e tem previsão de gastos de R$ 690,5 milhões para 2017.

Lei de Informática Nacional
Criada em 1991 e revista em 2004, a lei concede incentivos fiscais para empresas que produzem alguns hardwares e investem em pesquisa e desenvolvimento. Os gastos previstos para 2017 são de R$ 5,97 bilhões.

Inclusão digital
O programa, de 2005, oferece redução a zero das alíquotas do PIS/Cofins sobre a venda no varejo de computadores, notebooks, monitores, teclados, mouses, modems, tablets, smartphones e roteadores.

PADIS e PATVD
Os programas de apoio às indústrias de semicondutores e displays (PADIS) e de equipamentos para TV Digital (PATVD) oferecem um conjunto de incentivos fiscais para atrair investimentos às áreas. Ambos foram criados em 2007.

Recap

O Recap (Regime especial de aquisição de bens de capital para empresas exportadoras) reduz o pagamento de impostos pagos pelas indústrias exportadoras na compra de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos. Foi criado em 2005.


Endereço da página:

Links no texto: