Folha de S. Paulo


Retomada de acordos comerciais enfrenta obstáculos

Danilo Verpa/Folhapress
SANTOS - SP - 06.05.2016 - Projeto da Vale Logistica de interligacao (VLI) do porto de Santos ao norte do pais por meio da interligacao com as ferrovias que devem chegar ate o Maranhao. (Foto: Danilo Verpa/Folhapres, MERCADO). #infraestrutura
Projeto da Vale Logistica de interligacao (VLI) do porto de Santos ao norte do país

O Brasil mudou a direção da política comercial e busca novos acordos de livre comércio para exportar mais. Especialistas ouvidos pela Folha avaliam, no entanto, que o país chega atrasado e enfrentará dificuldades por causa do aumento do protecionismo.

A reorientação começou ainda no fim do governo da ex-presidente Dilma Rousseff (2011-2016), que foi obrigada a rever sua resistência aos acordos bilaterais por causa da grave crise econômica, e se consolidou quando o vice Michel Temer assumiu o poder, depois do impeachment.

Desde então, o Brasil busca avançar num acordo de livre comércio com o México e tenta retomar as negociações com a União Europeia, que já se arrastam há mais de 20 anos. Segundo apurou a reportagem, as discussões avançam mais rápido com os mexicanos e um acordo pode ser selado ainda neste ano, ou logo no início do próximo.

Ao mesmo tempo, o Brasil tem fechado acordos parciais sobre investimentos, compras governamentais e reconhecimento de patentes com diversos parceiros. "É uma postura pragmática, que mostra que pelo menos estamos nos movendo", diz Diego Bonomo, gerente executivo de comércio exterior da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Nos últimos meses, foram assinados sete acordos de proteção de investimentos, com Angola, Chile, Colômbia, Malawi, México, Moçambique e Peru. O Brasil também fechou com os peruanos o primeiro acordo de preferência em compras governamentais.

"O ideal seriam acordos mais amplos, mas o custo de produção do Brasil é muito alto. Dessa forma, fazemos o que dá menos trabalho e tem efeitos no curto prazo", diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil.

O BRASIL NO MUNDO

ISOLAMENTO

A nova política comercial tenta romper o isolamento do Brasil. Desde o surgimento do Mercosul em 1991, o país fechou em conjunto com os demais sócios do bloco três acordos de livre comércio: Egito, Israel e Palestina, que representam somente 1,3% das exportações brasileiras.

Durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma, o Brasil apostou todas as fichas nas negociações da Rodada Doha da Organização Mundial de Comércio (OMC), que prometiam um grande acordo global, incluindo o fim dos subsídios agrícolas dos países ricos. As divergências entre os participantes, no entanto, sepultaram a rodada.

Enquanto isso, os demais países fecharam centenas de acordos bilaterais. Pelos dados da OMC, hoje existem 423 acordos preferenciais em vigor no mundo. Os EUA têm 15 acordos. A União Europeia, 36. O México, que também é um país em desenvolvimento, já assinou 11 acordos.

CABELO EM PÉ

Para Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior, a resistência dos demais membros do Mercosul, principalmente a Argentina, e a alta competitividade da agricultura brasileira tornou muito difícil fechar acordos comerciais. "A agricultura brasileira sempre deixou os europeus de cabelo em pé", afirma.

Para os especialistas, o Brasil demorou a entrar no jogo e enfrentará muita dificuldade por causa do recrudescimento do protecionismo provocado pela crise econômica global de 2008, que atingiu em cheio os países mais ricos.

Nos EUA, a abertura comercial se tornou tema de campanha, com a candidata democrata Hillary Clinton sendo atacada por seu rival republicano na corrida à Casa Branca, Donald Trump. Na Europa, a saída do Reino Unido da UE e o aumento do número de refugiados também torna mais difícil novos acordos.

O ministro de Relações Exteriores, José Serra, acredita que o Brasil vai conseguir romper esses obstáculos e aumentar suas exportações. No fórum organizado nesta semana pela Folha com a CNI, Serra disse que a participação do Brasil no comércio exterior é muito pequena e que existem oportunidades para o país ganhar mercado lá fora mesmo em tempos de crise.


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